Motor Elko adiabático multicombustível: a maravilha tecnológica que nunca decolou

Na realidade, a história do motor Multifuel da Elko (abreviação para Elsbett Konstruction, seu fabricante) vêm desde a década de 30, quando Hitler encomendou ao Sr. Elsbett que desenvolvesse uma unidade motriz compacta, leve e capaz de queimar qualquer tipo de combustível vegetal ou fóssil, desde que fosse líquido. Esse propulsor, em pequenas propriedades ou fazendas, seria capaz de mover máquinas para moer grãos vegetais para a extração do óleo que seria utilizado como seu próprio combustível.

Ludwig Elsbett, o inventor inicial do motor Elko (Foto: reprodução/profi.deu)

E, além disso, esse mesmo motor poderia acionar o gerador da propriedade, criando energia elétrica, movimentando uma máquina agrícola e atuando onde quer que se necessitasse de potência no uso diário. Essa pequena e eficiente máquina seria uma mão na roda, tornando as propriedades isoladas totalmente independentes de quaisquer recursos externos.

Para a Guerra, um prato cheio. Sob quaisquer circunstâncias não se encerrariam as produções agrícolas, essenciais para a alimentação e continuidade do país. Essa era a visão quando o projeto inicial do motor Elko foi idealizado e concebido, que seria revolucionário falando de uma forma mundial.

O tal motor foi criado, desenvolvido, e, graças a um sistema simples, mas eficaz, de injeção direta, pulverizava nas câmaras de combustão qualquer combustível líquido. Assim, poderíamos despejar no tanque qualquer óleo desses usados na cozinha (de milho, de arroz, de soja, de girassol), ou subprodutos do petróleo (diesel, lubrificantes de motor diluídos em gasolina, querosene, fluídos de freio e por aí vai). Ele queimava qualquer coisa.

Qualquer combustível líquido o Elko queimava, quer fosse de origem vegetal ou fóssil (Foto: reprodução/minutodocaminhao.com.br)

Pois a guerra acabou, o tempo passou, mas o conceito criado pelo Elsbett foi reaproveitado pelo seu filho Klaus, que continuou o trabalho iniciado pelo pai nos anos 30. Chegando aos anos 80, a Elsbett Konstruktion, sediada em Hipoltstein, na região da Baviera (Alemanha), queria implantar a tecnologia dos motores multicombustíveis Elko para o grande público.

Aproveitando o grande desenvolvimento de materiais nesses passados 50 anos, Klaus inovou ainda mais. Além do motor que funciona normalmente no ciclo Diesel, com qualquer combustível, haviam revestimentos cerâmicos para pistões, cilindros, mancais, válvulas etc. Isso para que grande parte da energia térmica gerada pelo motor não fosse desperdiçada através do sistema de arrefecimento.

Além do novo motor Elko poder queimar vários combustíveis, ele não precisava de um sistema de arrefecimento: nada de radiador, tubulações, bomba d’água ou vaso de expansão. Sua operação de ciclo Diesel e a adoção de um turbocompressor (esse com intercooler), tudo para aproveitar ao máximo a eficiência térmica da máquina, o Elko teria um rendimento térmico altíssimo quando comparado a um outro motor convencional. Era adiabático: tipo de máquina que não perde calor para o ambiente, e aproveita toda a energia térmica como rendimento em sua operação.

Tive a oportunidade de testar aqui no Brasil, pela revista Quatro Rodas, um Audi 100 equipado com um Elko Multifuel, uma maravilha motriz. Era um três cilindros, turbocomprimido (as pás da turbina também eram revestidas com cerâmica para suportar o calor), com 1.45 litro de capacidade cúbica, produzindo 90 cv de potência máxima aos 4.500 rpm e torque espetacular de 17,9 mkgf a 3.000 rpm. O legal da máquina era que logo na arrancada ele já tinha força de sobra, pois movia o grande e pesado Audi (maior que o nosso Santana nacional), como se o carrão alemão não pesasse nada. Bem desenvolto.

O carro tinha câmbio manual de cinco marchas, disposto longitudinalmente, semelhante àquele usado pela linha VW mais luxuosa da época. Com esse carro, na estrada, fazíamos uma média ao redor dos 22 km/l daquela mistura que estava no tanque (passava dos 40 km/l em baixas velocidades), enquanto nos testes de desempenho e aceleração ele ia de 0 a 100 km/h em cerca de 15 segundos. A velocidade final passava dos 160 km/h. Números respeitáveis para a época, meados dos anos 80, e próximos aos do nosso Santana.

O Audi 100, sedanzão maior que o nosso Santana, acomodou muito bem o pequeno Elko Multifuel (Foto: reprodução/Quatro Rodas)

Mas alguém poderia me perguntar: onde está essa maravilha? Porque não tenho um motor Elko no meu carro? Tecnologicamente falando, todo período que andei com esse carro, não tive problema algum, quer seja nos ruídos (era mais silencioso, inclusive, que os nossos motores ciclo Otto da época), operação, condução e mais. Nenhum problema a bordo. Pelo contrário: era extremamente econômico, eficiente, silencioso e compacto para os nossos padrões da época.

Vale até falar que, na época, o Grupo Garavello já estava em fase adiantada de estudos e testes para construir uma fábrica que faria esse motor de três cilindros, outro maior para caminhões (com 170 cv), além de motores estacionários. Os planos eram tê-los em produção no início de 1989, todos eficientes, com baixíssimo consumo e muito a ver com o nosso país, inclusive atual. Poderíamos produzir, a exemplo do etanol, óleo vegetal para mover a frota nacional de ônibus e caminhões com motores Elko.

O Elko Multifuel instalado no Audi 100 era bastante pequeno e compacto (Foto: reprodução/Quatro Rodas)

Adiabático, mas como?

Na bem da verdade, o Elko era semi-adiabático, então trocava um pouco de calor com o ambiente. Fazia isso através do óleo lubrificante (tinha um radiador de óleo) e da irradiação natural do calor por seus componentes. Para realizar essa proeza, Klaus Elsbett revestia com cerâmica os principais componentes que recebiam irradiação direta de calor da combustão (válvulas, câmaras de combustão, cabeças dos pistões, parte superior dos cilindros, injeção direta), tudo para que não houvesse fusão dos metais por excesso de temperatura.

Audi 100 com motor Elko Foto: reprodução/Quatro Rodas)

Por tudo isso, não era nem um pouco barato de ser produzido. Tinha alta eficiência, mas custava caro, o que se refletia no custo final de fabricação. O Grupo Garavello, aquele que iria fabricá-lo no Brasil, e na época tinha força grande nos consórcios e outras aplicações financeiras, acabou falindo nos anos 90. Todo esse plano de construção desceu por água abaixo aqui, onde o projeto foi completamente esquecido. Na Europa, aparentemente, a situação não foi muito diferente.

Compartilhar:
Jornalista na área automobilística há 48 anos, trabalhou na revista Quatro Rodas por 10 anos e na Revista Motor Show por 24 anos, de onde foi diretor de redação de 2007 até 2016. Formado em comunicação na Faculdade Cásper Líbero, estudou três anos de engenharia mecânica na Faculdade de Engenharia Industrial (FEI) e no Instituto de Ensino de Engenharia Paulista (IEEP). Como piloto, venceu a Mil Milhas Brasileiras em 1983 e os Mil Quilômetros de Brasília em 2004, além de ter participado em competições de várias categorias do automobilismo brasileiro. Tem 67 anos, é casado e tem três filhos homens, de 20, 31 e 34 anos.