GM Celta: a sobrevida do Corsinha no Brasil

Os anos 90 foram, sem dúvidas, os mais competitivos no mercado automotivo nacional, e a categoria dos populares teve disputas acirradíssimas das marcas pela preferência nacional, inclusive internas. A Fiat, quando lançou o Palio, se deparou com dois produtos na prateleira, pois o Mille não perdeu fôlego. Já a Volkswagen investiu mais pesado na renovação da sua gama em 1999, lançando o Gol G3, mas continuou fabricando o modelo antigo como veículo de entrada (o Gol Special).

Enquanto isso, ao mesmo tempo, a GM preparava a nova geração do GM Corsa, acompanhando a evolução do irmão Opel Corsa no mundo, mas queria um produto mais barato, para concorrer diretamente com Fiat Mille, Ford Ka e o já citado VW Gol Special. Assim, em 1999, foram flagrados os primeiros protótipos do GM Celta, frutos do projeto Arara-Azul. Lançado em 2000 usando a plataforma B do Corsa de 1993 e até o mesmo parabrisas, o Celta foi concebido para ser barato.

Fruto do projeto Arara Azul, o novo popular da GM era derivado do Corsa de 1993 (Foto: Chevrolet/divulgação)

Conforme as palavras do David Wong, então consultor da Booz Allen & Hamilton, especializada em indústria automobilística, era “um Corsa simplificado”. E põe simplificado nisso: não havia ar-condicionado disponível, muito menos direção hidráulica, travas ou vidros elétricos, e a qualidade dos plásticos era baixíssima. Parte desses equipamentos chegaria opcionalmente a partir de 2001. Com linhas também simples e fluidas, podia receber kits de embelezamento e rodas de liga leve de 14” calçadas com pneus 185/60 nos concessionários.

Um kit de embelezamento e até rodas de liga aro 14 estavam disponíveis na rede de concessionárias (Foto: Chevrolet/divulgação)

O acabamento frágil era bastante criticado, pois o plano da GM era fazer do Celta o carro mais barato no Brasil, para isso economizando bem nos materiais utilizados em seu interior. Mesmo assim agradava pelo design geral, e seu painel era considerado bonito, com fundo branco no velocímetro, além de hodômetro e marcador de combustível digitais. Não havia termômetro, o que foi corrigido em 2005 no seu primeiro facelift.

Interior, apesar de agradável aos olhos, era bem espartano (Foto: Chevrolet/divulgação)

Simples em todos os quesitos e com baixo custo de manutenção, o Celta logo ganhou fama de robusto com seu motor 1.0 herdado do Corsa, que desenvolvia 60 cv de potência a 6000rpm e 8,3 kgfm de torque a 3000 rpm, acoplado a uma caixa de câmbio manual de 5 velocidades. Os pneus 145-80R13 recomendavam prudência nas curvas. Fazia de 0 a 100km/h em 15,64 seg. e chegava a bons (para a época) 150,4 km/h de velocidade máxima, também graças ao seu coeficiente aerodinâmico relativamente baixo. Era o popular mais rápido de sua época entre os 1.0 de 8 válvulas.

Seu consumo, ao menos nas primeiras unidades, não era muito bom, como atestava seu primeiro teste na edição 482 da revista Quatro Rodas, de setembro de 2000: Com médias de 8,81 km/l de gasolina na cidade, consumia tanto quando um GM Vectra 2.0 ou mesmo um VW Santana 2.0, muito longe de seus concorrentes diretos. O Mille Smart, por exemplo, fazia 11,22 km/l no mesmo percurso. Já na estrada, sua média era aceitável, fazendo 14,66 km/l, ante 15,58 km/l do Fiat.

Era o mais rápido dentre seus concorrentes 1.0 8V, mas consumo era alto nos primeiros testes (Foto: Chevrolet/divulgação)

Disponível inicialmente nas cores sólidas branco e verde, ou nas metálicas azul, vermelho ou prata, foi sucesso absoluto pela novidade no mundo dos populares do início da década de 2000. Com apenas quatro meses de vida, foram emplacadas 21.444 unidades do pequeno Celta.

No ano seguinte foram mais de 90 mil carros vendidos, e a partir de 2002, entrou no pelotão de elite (modelos que superam 100 mil unidades por ano), configurando sempre entre os quatro modelos mais vendidos do mercado. Neste ano, 2002, o modelo recebia a configuração inédita de 4 portas, novo volante e um conta-giros nos instrumentos, desta vez com fundo azul.

Em 2003, o motor herdado do Corsinha foi substituído pelo VHC (Very High Compression) de 70 cv a 6400 rpm e 8,8 kgfm de torque a 3000 rpm. Com o novo “coração”, o Celta agora fazia de 0 a 100km/h em 13,1 seg. e chegava a 155 km/h de velocidade máxima. Muita gente se considerava “piloto” com este carrinho, e ele realmente encarava os modelos de até 1.6 litro com muita garra, principalmente em saídas de semáforo.

Junto da família de motores VHT, o Celta ganhava opção do 1.4, que estreava na versão Super (Foto: Chevrolet/divulgação)

Para o ano seguinte, 2004, chegava o motor 1.4 de 85 cv a 5800 rpm e 11,8 kgfm de torque a 3000 rpm. Mais rápido do que nunca com o motor maior, o popular da Chevrolet atingia 161 km/h de velocidade máxima e fazia de 0 a 100km/h em 12,3 seg. Em 2005, além da chegada da tecnologia flex, passou a ser oferecido como opcional para todas as versões o kit de acessórios Off-Road, que poderia ser instalado inclusive em exemplares usados. Era a moda automotiva da época, mas graças a Deus não deu certo!

Pacote Off-Road vinha para suprir a moda da época (Foto: Chevrolet/divulgação)

Sucesso não só no Brasil, o Celta também foi vendido na Argentina e Uruguai como Suzuki Fun, e em países como Guatemala, Nicarágua, El Salvador e Jamaica (nesses casos, ele era o GM Celta mesmo). Ah, e também esteve disponível nas ilhas de Aruba e Curaçao, territórios holandeses no Caribe. Na maioria dos mercados de exportação, prevaleceu o motor 1.0 (neste caso, sempre o antigo de 60 cv), com exceção da Argentina onde o 1.4 era padrão.

Sucesso não só no Brasil, o Celta virou até Suzuki Fun em países vizinhos (Foto: Suzuki/divulgação)

Melhorias chegavam também na linha 2007 dos Celta fabricados no segundo semestre de 2006, que passavam por sua primeira grande reformulação interna, externa e mecânica. Ali estreava a carroceria sedan (o Prisma), uma história rica a qual falarei em breve.

Com as vendas em alta, boa aceitação do público e até queridinho no mercado de usados graças a sua robustez, mecânica simples e muito barata de ser mantida, o Celta, até hoje, é aclamado por fãs que lamentam sua despedida em 2015, ainda em sua única geração. Nesses 15 anos de história, após 1,5 milhão de unidades produzidas, ele continua sendo um popular muito valorizado no mercado atual.

1,5 milhão de unidades em 15 anos: um popular de sucesso (Foto: Chevrolet/divulgação)

Mas, convenhamos, era legal essa disputa dos populares no início do milênio, não?

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Leonardo França é formado em gestão de pessoas, tem pós-graduação em comunicação e MKT e vive o jornalismo desde a adolescência. Atua como BPO, e há 20 anos, ajuda pessoas a comprar carros em ótimo estado e de maneira racional. Tem por missão levar a informação de forma simples e didática. É criador do canal Autos Originais e colaborador em outras mídias de comunicação.