É inegável que, desde a I Guerra (1914 – 1918), o mundo vive sob as regras americanas de mercado. Essas regras têm conceitos inerentes a ela. Os dois principais são exaltação ao Selfmade man (pessoa que se faz sozinha) e a ideia de vencedor x perdedor. Vários escritores americanos escrevem sobre a crueldade que é a meritocracia, soma dos dois conceitos acima.
Há aspectos positivos? Claro que sim. Como aquele povo precisa lidar o tempo todo com a competição, acaba por criar meios para blindar-se. Importante para eles é bater a própria marca, como melhorar seu tempo nos 100 m rasos, mesmo que ninguém mais esteja correndo contra ele. Assim, ele se sentirá sempre vencedor. É justamente o oposto do pensamento de Nelson Piquet, que diz que “O segundo lugar é o primeiro entre os perdedores”.

Resolvidas as questões filosóficas, vêm as psicológicas. Freud dizia que as pessoas buscam reconhecimento. Numa sociedade em que vencer é ficar milionário, é de se esperar o enaltecimento dos mais ricos, geralmente, atribuindo-lhes atributos que não lhes cabem, especialmente, o de selfmade man. É então que entra o homem da moda, como foi Henry Ford no entreguerras, Bill Gates nos anos 1980, Steve Jobs nos anos 2000 e Elon Musk atualmente. Todos vieram de famílias abastadas e tiveram suas biografias reescritas para introduzir a ideia de que venceram por meios próprios.
Ao contrário de Huckemberg, que usou a internet como ferramenta para ganhar dinheiro, Musk usa para criar uma aura de invencibilidade, de estar um passo adiante de seu tempo, construindo o futuro. É só ver a quantidade de canais “paga-paus” de Musk no Youtube, Instagram e TikTok. Foi assim com a Tesla e o carro elétrico. Na medida em que a concorrência começou a se adaptar à nova tecnologia e a usar seu peso para negociar preços, seu interesse pelo produto declinou.

Hoje, quando a BYD já a superou em número de veículos vendidos e antecipou-se à Tesla na internacionalização, os olhos de Musk voltaram-se para o espaço através de sua outra empresa SpaceX, seja pelo lançamento de foguetes privados, seja pela disseminação de satélites de órbita baixa, capazes de trafegar informações em alta velocidade e sem o atraso inerente à distância causada pela órbita de 3.200 km, usual aos satélites de comunicação tradicionais.

Junte-se uma rede com milhares de satélites, situados pouco acima da atmosfera com o domínio da tecnologia do veículo autônomo e Musk poderá dominar a logística mundial. Desde sempre ele soube que o veículo autônomo dependeria da internet e de protocolos de comunicação intra e extra veicular. Ninguém seria ingênuo a ponto de pensar que teria a única linha de automóveis a guiarem-se a si próprios, mesmo porque a ideia de autonomia antecedeu a Tesla em décadas, começando por metrôs, tratores agrícolas e outros usos em ambientes mais controlados.
A meta de Musk só é possível graças à IANA (Internet Adress Number Authority). Ela é a entidade do governo americano que atribui endereços IP para o mundo inteiro, exceto Rússia e China, que tem autoridades próprias, comunicando-se com o resto do mundo como em uma VPN. É ela que permite concentrar todas as comunicações mundiais sob o mesmo padrão, consequentemente, habilitando a tomada de dados de qualquer lugar do mundo.

De forma mais profunda, é justamente o domínio da concessão de endereços IP que permite que alguém, de fora do território, consiga controlar automóveis, caminhões, drones, até navios, um dia, incluindo aviões de carreira. Isso é um risco para a soberania nacional, inclusive à dos Estados Unidos.
Países no mundo inteiro estão despertando para esse risco e já há movimentos para que a concessão de endereços IP destinada à comunicação internacional passe a uma entidade supranacional. Assim, poderemos ter veículos autônomos de qualquer espécie, sem que seu controle fique nas mãos, seja de um só país, seja de uma só pessoa.