VW Passat Iraque: o brazuca nas terras do Saddam Hussein

Produzido no mundo desde 1973 como um carro médio, o VW Passat chegou ao Brasil em 1974 com motor BR 1.5, versões L e Standard, além da carroceria de duas portas como padrão. Logo se tornou um sucesso, sendo um dos carros médios mais desejados de seu tempo.

Primeiro Passat tinha sempre carroceria de duas portas (Foto: VW/divulgação)

Dois anos depois chegava a carroceria de quatro portas, além das versões LM e LS, seguidas do desejado Passat TS em 1976, este com motor BS 1.6 e um desempenho muito arisco. O TS, de “Touring Sport”, era capaz de encarar algumas versões de carros de maior cilindrada como o GM Opala seis cilindros e Ford Maverick V8. No mesmo ano chegava ao nosso mercado também a configuração de 3 portas, aquela com tampa do porta-malas junto ao vidro traseiro, que acabou tendo grande aceitação.

De olho no exterior, a Volkswagen começou a produção da configuração de 5 portas, exclusivamente para exportação, e logo algumas unidades passaram a ser comercializadas na América Latina, África e Europa.

Em pouco tempo, a linha do Passat estava completa (Foto: VW/divulgação)

Logo após o lançamento da versão LSE em 1978, a mais luxuosa de nosso mercado, algumas unidades foram destinadas ao mercado iraquiano, mas ainda sem nenhum acordo de exportação oficial. No mesmo ano foi lançada a configuração Surf, com apelo ao público jovem e acabamento básico. Em 1979 o nosso Passat ganhava em seu primeiro facelift, com a frente do Audi 80 comercializado no exterior até 1978, e aí suas vendas disparavam.

Até 1982 usava o motor BS 1.6, com 96 cv SAE a 6.100 rpm (72cv ABNT) e 13,2 kgfm de torque a 3600 rpm, fazendo de 0 a 100 km/h em 13,1 segundos, atingindo 160 km/h de velocidade máxima e rodando, em média, 9,0 km/l na cidade e 12,1 km/l na estrada, sempre com gasolina.

Ainda em 1983, já ostentando seu último visual, com quatro faróis, o modelo LSE começou a ser exportado para o Iraque graças a um inusitado acordo comercial: os carros eram pagos pelo governo do Iraque em petróleo, repassado à Petrobras, que por sua vez pagava o valor correspondente a cada carro à Volkswagen do Brasil, em câmbio vigente. Entre 1983 e 1988, 170.000 unidades, todas LSE, deixaram a fábrica de São Bernardo do Campo (SP) através desta negociação, sempre rumo ao Oriente Médio.

Os Passat Iraque são facilmente identificados pelos para-barros e interior especial, falando da estética (Foto: VW/divulgação)

Comparado com o Passat LSE destinado ao mercado nacional, modelo iraquiano, apelidado carinhosamente de “Passat Iraque”, trazia alterações significativas como o radiador de cobre, pneus têxteis (de aço aqui, ou radiais), ventilador de 250 W, chapa de proteção do motor de série (peito de aço), para-barro para as quatro rodas, quatro ganchos de reboque (dois a mais que o modelo nacional) e ar-condicionado de série.

Os carros eram especiais para o mercado iraquiano, e o negócio envolvia quase um escambo por petróleo. Aqui, na unidade, não há os para-barros, que eram de série (Foto: reprodução/The Garage)

Seu motor era o MD-270 e tinha 72 cv ABNT declarados, mas sua potência máxima era atingida a 5.200 rpm, isso com 12,2 kgfm de torque a 2.600 rpm, ou seja, a sensação de potência vinha antes, tornando assim sua condução urbana mais confortável, exigindo menos trocas de marchas. Um pouquinho mais lento, fazia de 0 a 100 km/h em 15,2 segundos, atingia 151 km/h de velocidade máxima e era mais econômico, conseguindo médias de 10,79 km/l na cidade e 14,94 km/l na estrada, também com gasolina.

Motor MD-270 foi o único mantido nos Passat Iraque, mesmo após a chegada do AP (Foto: Christian Castanho/Quatro Rodas)

A partir de 1985, os Passat de exportação adotaram novamente as evoluções do modelo nacional, como para-choques envolventes, novo tabelier, novo painel de instrumentos, além de um acabamento primoroso à la Santana, todo em veludo cinza ou vermelho (dos bancos ao carpete), dependendo da escolha do comprador.

Àquela época, a Volkswagen do Brasil lançou em nosso mercado o cultuado, e então moderno, motor AP-600, com 80 cv ABNT a 5.600 rpm e 12,75 kgfm de torque a 2600 rpm na versão a gasolina, além da parceria com o câmbio de 5 marchas – fora a versão a álcool com 90 cv a 5.600 rpm e 13,05 kgfm de torque a 2600 rpm.

Por estratégia da Volkswagen do Brasil, os motores dos Passat enviados para o Iraque não foram atualizados, facilitando assim o esquema de exportação de peças de reposição para o Oriente. O câmbio também não foi atualizado, e os modelos continuaram usando o longo de 4 velocidades (3+E).

Nos idos da segunda metade dos anos 80, o Iraque, governado pelo então ditador Saddam Hussein, enfrentava sérios problemas de cunho político e financeiro, impactando para a Volkswagen do Brasil no fornecimento dos veículos. Com o excedente no pátio graças a baixa demanda dos iraquianos, a partir de junho de 1986, as unidades tipo exportação foram destinadas ao mercado nacional, só que como edição especial.

Com muita resistência dos concessionários, os modelos surpreenderam em vendas e houve até fila de espera, pois custavam o equivalente ao nosso Passat LS Village, mecanicamente atualizado graças seu motor mais potente e câmbio 5 marchas, mas menos equipado, com acabamento simplificado e sem ar-condicionado, nem como opcional.

Os Passat LSE “Iraque” remanescentes, que acabaram sendo vendidos no mercado nacional, eram uma boa opção para quem queria um Volkswagen quatro portas 0 km com bom acabamento e ar-condicionado, já que o VW Santana mais barato e com quatro portas também não tinha o equipamento, nem como opcional. Durando nas vendas até acabarem os estoques, o Passat Iraque deixou de ser oferecido em nosso mercado em meados de 1987.

Os estoques das tais unidades não exportadas durou até meados de 1987. Lá no Oriente Médio, eles são vistos rodando até hoje… (Foto: Juca Varella/Folha)

No total, foram exportadas 221 mil unidades do médio da VW para o Iraque e outros países, fora as 676.829 comercializadas em nosso mercado. Existem atualmente 7.576 unidades registradas do Passat Iraque em circulação, sendo 6.395 unidades ano 1986 e 1.181 unidades ano 1987. Os dados são do Denatran, base março/2023. E se você tivesse opção em 1986 ou 1987, levaria um desses 0 km para sua casa?

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Leonardo França é formado em gestão de pessoas, tem pós-graduação em comunicação e MKT e vive o jornalismo desde a adolescência. Atua como Consultor Organizacional na FS-França Serviços, e há 21 anos, também como consultor automotivo, ajudando pessoas a comprar carros em ótimo estado e de maneira racional. Tem por missão levar a informação de forma simples e didática. É criador do canal Autos Originais e colaborador em outras mídias de comunicação.