GM Chevette Automático: o primeiro compacto nacional sem pedal de embreagem
Em 1973 foi lançada no Brasil a quarta geração do Opel Kadett. Em época de regime militar, a Chevrolet brasileira rebatizou o moderno automóvel de “Chevette” (já usado no exterior para algumas versões do Kadett), a fim de evitar qualquer associação à patente militar. Usava um moderno, para a época, motor 1.4 com 68 cv de potência SAE a 5800 rpm (56 cv ABNT) e 9,8 kgfm de torque a 3800 rpm, permitindo aceleração de 0 a 100 km/h em 19,1 segundos e máxima de 140,2 km/h, números muito bons para o início dos anos 70.
Concorrente do VW Brasília, Dodge 1800 e Ford Corcel, o Chevrolet Chevette fez muito sucesso pelo conforto, estilo e robustez, que foi comprovada com o passar dos anos. E com sua tração traseira, angariou fãs pela boa desenvoltura em pisos difíceis, sendo um concorrente direto dos VW a ar (imbatíveis neste tipo de uso), ou mesmo na possibilidade de manobras mais audaciosas e exibicionistas com alguns garotos aventureiros ao volante.
Anos mais tarde, já com sua frente em cunha e faróis retangulares após algumas reestilizações, ganhou mais integrantes na família (o station Marajó e o esportivo S/R, ambos de 1980), além de melhorias, inclusive na mecânica: além do 1.4, era novidade o motor 1.6, com 78 cv SAE a 5800 rpm (66 cv ABNT), 12,4 kgfm de torque a 3600 rpm, permitindo uma considerável melhora em seu desempenho (0 a 100 km/h em 17,64 segundos e máxima de 149,377 km/h, segundo testes da época). Em 1983, ano que comemorou o título de carro mais vendido do Brasil, ele ganhou até uma picape, a Chevy 500, e toda a linha já ostentava um visual novo e mais moderno, que o aproximava do Monza.
O público logo gostou da novidade, tanto que, a partir de 1984, todo Chevette passou a ser 1.6, o que permitia um tremendo avanço não só na linha do modelo da GM, como também no mercado automotivo nacional: em março de 1985 era apresentada sua linha 86, onde sedan, hatch, pick-up e station ganhavam conforto de carro médio graças a opção de uma transmissão automática de 3 velocidades. Naquele tempo, essa era uma tecnologia exclusiva de carros médios e grandes, como Ford Del Rey, VW Santana, seu irmão maior Opala, ou os já descontinuados Dodge Polara e Ford Galaxie. O Chevette e sua família seriam os primeiros nacionais compactos a abandonarem o pedal de embreagem em prol do câmbio automático.
O novo opcional, importado da Alemanha e também novidade no médio Monza, dava mais comodidade e status aos compactos, em tempo que as definições de conforto e luxo eram outras. Hoje é impossível imaginar um compacto com câmbio automático sem ar-condicionado ou direção assistida, configuração possível para qualquer um dos integrantes da família Chevette, mas, naquele tempo, até mesmo um VW Santana CD, topo de linha, poderia ser montado com este curioso pacote.
O Chevette agradou seu público com a novidade da tal transmissão automática. Sua alavanca era do tamanho de uma equivalente da transmissão manual, sem atrapalhar o manuseio dos instrumentos ou mesmo o movimento das pernas do motorista. Sem contar que requeria apenas mudanças sutis no console central dos modelos com ela equipados. A caixa, com as posições P, R, N, D, 2 e 1 (limitando o carro na primeira ou segunda velocidade), tinha nesse modo um ótimo aliado para as subidas mais sinuosas de serra: a tração traseira.
Os Chevette automáticos, identificados pela plaqueta “AUTOMATIC” na tampa traseira, eram elogiados pela suavidade, sem trancos nas trocas de marchas, mesmo nas acelerações mais vigorosas. Outra comodidade era a função hoje conhecida como “assistente de partida em rampa”, que, de certa forma, já era de série neles. Com ela, nas saídas em subida que exigiriam a coordenação de comandar embreagem, freio e acelerador, o motorista controlava apenas a aceleração com o pé direito. Mesmo em ladeiras muito íngremes, o carro não se movimentava para trás, graças a um trabalho do conversor de torque, que mandava para as rodas, de forma automática, sem precisar de pressão no acelerador, a força necessária para evitar regressões.
Sua agilidade não era comprometida. Mesmo lidando com a longa e limitada transmissão de três velocidades, conseguia acelerações quase tão boas quanto as de modelos manuais: podia acelerar de 0 a 100 km/h em 17,66s, correndo até os 147,54 km/h de velocidade máxima (contra cerca de 149 dos modelos equivalentes com câmbio manual). Porém, claro, havia um preço do conforto, e ele estava no consumo de combustível: usando etanol, o Chevette automático registrava 6,9 km/l na cidade, contra 7,5 km/l da versão manual. Na estrada, a 100 km/h, eram 10,66 km/l no AT, versus os mais de 12 por litro dos carros “comuns”.
A frenagem e os demais pontos da linha Chevette não eram comprometidos, permanecendo o conforto e estabilidade de sua elogiada suspensão, o bom acabamento interno com detalhes bem cuidados, além do baixo nível de ruído a bordo. O que não tinha jeito era a ergonomia, quase sempre ruim: com bancos planos, pouco apoio para o motorista nas curvas, e volante deslocado à esquerda, graças a uma falha de projeto, dirigir a linha compacta da GM não era a melhor tarefa.
Sozinho, o opcional da transmissão automática custava Cr$3.854.442,00, ou R$14.162,49 em valores atuais (INPC/IBGE). Um tanto caro, mas foi um extra que seguiu sendo oferecido até a saída de linha do Chevette 1.6 em sua carroceria sedan, lá em 1993. A Chevrolet, desde então, não abandonou esse seleto público, e manteve o opcional Automatic também nos pequenos Kadett (com a mesma caixa de três marchas), Corsa Sedan (já com quatro velocidades), sem contar a oferta para os modelos médios e grandes.
É certo que, nos dias de hoje, o Chevette Automático seria visto com relativa frequência nas ruas, mas, entre os anos 80 e 90, adquirir um era motivo de piadinhas: “carro de preguiçoso”, “carro de quem não sabe dirigir”, sem contar o cruel apelido de “carro de aleijado”. Apesar de ser tarefa difícil encontrar um em pleno 2024, ainda bem que os tempos mudaram!