GM Celta 1.4: a energia que durou pouco

Lançado em setembro de 2000 com a mesma plataforma B do Corsa de 1993 e até peças compartilhadas, como o para-brisas, o Celta foi concebido para ser barato, focando em roubar mercado de rivais como Fiat Mille, Ford Ka e VW Gol Special, por exemplo. Junto dele, estreava a fábrica que o produziria, localizada em Gravataí (RS). Conforme as palavras do David Wong, então consultor da Booz Allen & Hamilton, especializada em indústria automobilística, o Celta, cujo nome de projeto era “Arara Azul”, era “um Corsa simplificado”.

E bota simplificado nisso, pois no começo não havia ar-condicionado disponível sequer como opcional, muito menos direção hidráulica, travas ou vidros elétricos, e a qualidade dos materiais internos era baixíssima. Com linhas também simples e fluídas, poderia receber kits de embelezamento e rodas de liga leve de 14 polegadas calçadas com pneus 185/60 nos concessionários. Somente a partir de 2001, ar-condicionado e travas elétricas passaram a ser oferecidos como opcionais.

Carro era simplíssimo, e para baratear a produção tinha peças compartilhadas com o Corsa, como o parabrisas (Foto: Chevrolet/divulgação)

O acabamento frágil era bastante criticado, pois o plano da GM era fazer do Celta o carro mais barato no Brasil, para isso economizando bem nos plásticos e tecidos utilizados em seu interior. Ao ser lançado, não bateu sua meta, pois o Mille Smart ainda custava menos. Mesmo assim agradava pelo design, e seu painel era considerado bonito, com fundo branco nos instrumentos e marcador de gasolina/hodômetro digitais. Não havia marcador de temperatura do motor, o que foi corrigido em 2006 com o seu primeiro facelift.

Simples em todos os quesitos e com baixo custo de manutenção, o Celta logo ganhou fama de robusto, e tinha a praticidade de poder ser comprado pela internet. Seu motor era o mesmo 1.0 8v herdado do Corsa, que desenvolvia 60 cv a 6000 rpm de potência e 8,3 kgfm de torque a 3000 rpm, acoplado a uma caixa de câmbio manual de 5 velocidades. Os pneus 145/80R13 recomendavam prudência nas curvas, ainda que o hatch não fizesse feio na dinâmica geral. Levíssimo, acelerava de 0 a 100 km/h em 15,64s e chegava a bons (para a época) 150,4 km/h de velocidade máxima. Era o mais rápido entre os 1.0 de 8 válvulas.

Como grande vantagem, uma robusta e conhecida mecânica, o que facilitava a manutenção (Foto: Chevrolet/divulgação)

Mas, se saía na vantagem no desempenho, o pequeno Chevrolet perdia no consumo: com médias de 8,81 km/l de gasolina na cidade, bebia tanto quando um GM Vectra 2.0 ou um VW Santana 2.0, ficando muito aquém dos seus rivais diretos. O Mille Smart, por exemplo, conseguia 11,22 km/l nas mesmas situações. Na estrada, sua média era aceitável, fazendo 14,66 km/l, ante 15,58 km/l do Fiat.

A linha 2003 trazia novidades, sendo a configuração de 4 portas, volante de direção de 3 raios com acabamento macio, e um conta-giros no painel, desta vez com fundo azul. O motor herdado do Corsa de 1994 foi substituído pelo 1.0 VHC (Very High Compression) do Corsa 2003, e tinha 70 cv a 6400 rpm com 8,8 kgfm a 3000 rpm. Mais ágil, agora o Celta fazia de 0 a 100 km/h em 13,1s e chegava aos 155 km/h de máxima. Muita gente se considerava “piloto” guiando este carrinho, e ele realmente encarava os modelos de até 1.6 litro com muita garra, principalmente em saídas de semáforo.

Linha 1.4 debutou em 2003. Era um pedido do público e uma forma da Chevrolet conseguir mais mercado (Foto: Chevrolet/divulgação)

Foi só na linha 2004, apresentada em agosto de 2003, que chegou o Celta 1.4, um pedido recorrente do público consumidor, que buscava melhor desempenho aliado em um carro pequeno, à Chevrolet, que também tinha como missão incomodar o Ford Ka 1.6. De início, o primeiro Celta com motor maior que 1.0 litro podia ser adquirido com duas ou quatro portas, em duas versões: 1.4 e a Energy 1.4, criada para divulgar o novo motor mais potente. Logo em seguida chegava ao catálogo também a Super 1.4. Na sua estreia, custava básico R$19.420,00 (equivalentes a R$75.412,00 atuais pelo índice IGP-M), um acréscimo de cerca de R$2,5 mil da época frente a versão mais simples com motor 1.0.

Seu 1.4 8v também vinha emprestado do Corsa de primeira geração, mas se aprimorava com injeção multiponto, embora continuasse movido só a gasolina. Tinha 85 cv a 5800 rpm e 11,8 kgfm de torque a 3000 rpm, animadores para um carrinho que não passava dos 900 kg (o mais simples tinha só 834 kg). Ainda assim, a Chevrolet falava em tímidos 161 km/h de velocidade máxima com um 0 a 100 km/h em 12,3s.

Se andava mais, não ficava distante do 1.0 no consumo urbano: em testes da época, conseguiu 8,48 km/l de gasolina, ainda que a Chevrolet falasse em 11,7 km/l oficiais. Na estrada era bastante econômico, chegando a 16,42 km/l em testes da época (superando os 15,9 km/l divulgados pela fabricante). Como curiosidade, para corrigir o incômodo câmbio de relações curtíssimas dos Celta 1.0, na versão 1.4 era adotado um novo escalonamento de todas as cinco marchas, que pegavam suas relações emprestadas do finado esportivo Corsa GSi, com 1ª, 2ª e 3ª longas seguidas de 4ª e 5ª mais curtas. A relação final do diferencial estava mais longa também, o que permitia menor rotação do motor nas viagens.

O mais simples trazia como itens de série barras de proteção contra impactos laterais, cintos de segurança laterais traseiros de 3 pontos, cintos de segurança dianteiros com ajuste de altura, encostos de cabeça traseiro, vidros verdes, velocímetro com fundo escuro e ponteiro iluminado, instrumentação digital para hodômetro total/parcial e marcador de combustível, relógio digital, rodas de ferro aro 13 com calotas integrais, banco traseiro com dois apoios de cabeça, porta copos integrado na tampa do porta-luvas e espelhos retrovisores externos com comando interno manual. Quando básico, sem opcionais, vinha com partes do acabamento interno em plástico azul, mesma cor do desenho no tecido dos bancos.

Opcionalmente, em um pacote chamado “Mais”, oferecia ar-quente com sistema de recirculação de ar, desembaçador e limpador do vidro traseiro, protetor de cárter, para-brisas degrade, temporizador do limpador de para-brisas, e para-choques da cor do veículo. O ar-condicionado vinha como outro opcional a parte, mas só poderia ser adquirido junto com os itens do Pacote Mais.

A versão Energy, estreante do motor 1.4, somava os itens anteriores com o painel de instrumentos com conta-giros, acabamentos internos na cor prata, luzes internas na cor verde, emblema “Energy” vermelho nas portas dianteiras, alça de teto para o passageiro dianteiro e espelho no quebra-sol direito. Na Energy também havia ar-condicionado como opcional, mas, em todas as versões, só havia direção hidráulica com acessório, adquirido na concessionária.

A Chevrolet, aliás, se gabava por oferecer cerca de 50 itens de comodidade, segurança, conforto e personalização como acessórios do Celta, junto de cores como branco, preto, prata, azul e vermelho. O motor 1.4 durou até pouco depois do seu primeiro facelift, que estreou na linha 2007, embora tenha sido onipresente no “Celta sedan”, o Prisma de primeira geração. O motivo do fim foi a baixa procura da versão mais potente do hatch, o que casou com a chegada do Prisma no final de 2006. Muito se falou sobre a chegada de um novo Celta 1.4, já com motor Econo.Flex de até 97 cv de potência, em meados de 2010, o que nunca ocorreu de forma oficial, infelizmente.

Mundo afora, além do Brasil, o Celta foi oferecido também na Argentina e o Uruguai como Suzuki Fun, e em países como Guatemala, Nicarágua, El Salvador e Jamaica, nestes mantendo seu nome original. Também esteve disponível nas ilhas de Aruba e Curaçao, territórios holandeses no Caribe. Na maioria dos mercados de exportação, prevaleceu o motor 1.0 antigo de 60 cv, a não ser na Argentina, onde o 1.4 foi padrão.

Com tanto sucesso, graças a sua mecânica simples e muito barata, o Celta é aclamado por fãs que lamentam sua despedida em 2015 após 1,5 milhão de unidades produzidas. Como prova do seu sucesso, segue muito valorizado no mercado de usados, e acaba sendo uma das principais escolhas para primeiro carro ou como meio de transporte diário.

A versão 1.4 durou pouco, cerca de três anos, mas o Celta acumulou mais de 1,5 milhão de unidades produzidas em Gravataí, sendo que a maioria continua rodando firme e forte por aí (Foto: Chevrolet/divulgação)
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Leonardo França é formado em gestão de pessoas, tem pós-graduação em comunicação e MKT e vive o jornalismo desde a adolescência. Atua como BPO, e há 20 anos, ajuda pessoas a comprar carros em ótimo estado e de maneira racional. Tem por missão levar a informação de forma simples e didática. É criador do canal Autos Originais e colaborador em outras mídias de comunicação.