Alfa Romeo 2300: 50 anos do sedan repleto de pioneirismos (parte 1)

O Alfa 2300 está fazendo aniversário agora em março de 2024: 50 anos desde seu lançamento, ocorrido em 1974. Um carro nacional que tem muita história para contar, e que foi produzido durante doze anos consecutivos (de 74 até o final de 86), sendo o primeiro e único Alfa Romeo nacional. O que pouca gente sabe é que, apesar de ter sido desenhado e desenvolvido na Itália (incluindo os testes de rodagem com os primeiros protótipos), o 2300 foi criado exclusivamente para ser brasileiro, fabricado por aqui e vendido ao nosso público, sem similares mundo afora. Seu desenho de muita personalidade foi baseado nas linhas do Alfetta Berlina italiano, e a base mecânica seguia a mesma do seu antecessor FNM 2150, com apenas modificações pontuais. 

Era uma fórmula de sucesso, que criou um sedan de luxo competitivo e com bastante personalidade própria, surpreendendo o mercado nacional graças ao pioneirismo de vários itens que, na época, só existiam no 2300: freios a disco nas quatro rodas, cintos de segurança dianteiros com três pontos de fixação, coluna de direção bipartida (se dividia em colisões, para não atingir o condutor), carroceria com áreas de deformação previstas, apoios de cabeça para o banco traseiro, volante ajustável em altura, sem contar os quatro faróis dianteiros, dois redondos de cada lado, que se acendiam de forma simultânea no facho baixo ou alto, e pneus radiais de série. 

O Alfa nacional estava sempre no topo da cadeia de modelos brasileiros quando o assunto era preço, junto dos Ford Galaxie/Landau/LTD, Dodge V8 e Opala seis-em-linha: dependendo da versão, era o segundo carro mais caro do Brasil, custando o equivalente a cinco VW Fusca na época.  

Lançado inicialmente em versão única, cujo motor era derivado do FNM 2150 de 1969, com um novo virabrequim de curso maior, o Alfa 2300 tinha uma carroceria totalmente inédita, mas ainda usando uma plataforma semelhante a do antigo FNM (o entre-eixos de 2,73 m era apenas 1 cm maior, com a mesma bitola dianteira e uma traseira 3 cm maior no Alfa). Além de compartilharem o mesmo sistema de direção, com frequentes críticas quanto ao seu peso (não havia assistência hidráulica até 1981), os sedans 2150 e 2300 se equivaliam também nas suspensões (braço triangular duplo na dianteira e eixo rígido com barra Panhard na traseira). 

Suas virtudes mecânicas, aliás, eram sempre bem exploradas nas propagandas e catálogos da época (Foto: reprodução/catálogo Alfa Romeo 2300)

O novo motor 2.3, tecnicamente desenvolvido na Itália, tinha os mesmos predicados daquele que movia os FNM 2150, com duplo comando de válvulas no cabeçote fundido em alumínio, câmaras de combustão hemisféricas com velas centrais e válvulas de escape refrigeradas a sódio, para melhor eficiência. O interessante do 2300 é que, mesmo utilizando uma taxa de compressão baixa (7,5:1), a recomendação era para o uso de gasolina azul, especial com alta octanagem. Outro ponto de destaque era seu enorme tanque de combustível com 100 litros de capacidade, em uma época em que, aqui no Brasil, os postos de combustíveis fechavam aos sábados e domingos, e, ainda assim, o 2300 permitia grande alcance nas viagens.

Motor 2300 também partia do antigo 2150, garantindo ao novo Alfa um desempenho elogiável para a época (Foto: Alfa Romeo/divulgação)

Eram 140 HP de potência e 21 mkgf de torque nas normas SAE da época (cerca de 104 cv e 18,5 mkgf atuais), que moviam um carro com mais ou menos 1.300 kg e de tração traseira. Atrelado a um câmbio de cinco marchas manual, derivado dos FNM, e com carburador de corpo duplo Solex, o motor 2.3 fazia do Alfa um sedan rápido para a época: 0 a 100 km/h em destacáveis 11,7 segundos e máxima de 170 km/h, números bem superiores aos dos FNM e muito respeitados para a primeira metade dos anos 70. Para se ter uma ideia, na época, a marca dizia que, trafegando a 135 km/h, o motor 2.3 utilizava apenas metade da sua potência máxima. 

Aproximadamente dois anos e meio após seu lançamento original, já no Salão do Automóvel de 1976 debutava a versão B (de “Brasil) do 2300, com mais requinte e luxo, bancos aveludados, um novo painel com detalhes em madeira e as memoráveis maçanetas externas do tipo embutido, que viraram febre nos fora-de-série e afins. Como não havia mais a versão original, apenas a 2300 B, a engenharia da Alfa aproveitou a ocasião para fazer algumas mudanças no motor do sedan, que já permitia abastecimento com gasolina comum ao invés da especial azul: foram retrabalhados os comandos de válvulas e coletor de admissão, o que resultou em ligeiros aumentos na potência e torque. 

A linha seria composta ainda pela Alfa 2300 TI (“Turismo Internacional” abreviado, depois sendo renomeada para TI4), sigla que identificava os Alfa Romeo de alta estirpe, com mais sofisticação e desempenho. O grande destaque desse sedan, que chegou no começo de 1977, estava no motor: ao invés do propulsor de 2.315 cm³ ser alimentado por um único carburador Solex 34 mm de corpo duplo, na TI eram dois Solex de corpo duplo horizontal, cada um alimentando um cilindro individualmente. Com seus 40 mm, era capaz de melhorar muito o enchimento dos cilindros, aumentando a potência máxima de 141 para quase 150 HP SAE (mais ou menos 110 cv ABNT), com torque já superando a casa dos 23 mkgf brutos. 

A Alfa 2300 TI foi a que mais marcou a história do sedan (Foto: Alfa Romeo/divulgação)

Com novo parachoque dianteiro que englobava as luzes de seta e o requinte da antena elétrica do rádio fixada na lateral traseira esquerda, a Alfa TI era identificada pelo emblema do trevo de quatro folhas fixado nas colunas C (o “quadrifoglio”), e completava a instrumentação do painel com voltímetro, manômetro e luzes-espia. Seguiam os ajustes confortáveis e macios da 2300B, mesmo que o desempenho da TI fosse notavelmente superior: 0 a 100 km/h em 10,8 segundos (1s a menos que a outra versão) e velocidade máxima de 175 km/h. Apesar de serem números dignos dos atuais hatches pequenos com motor 1.0 turbo, para a década de 70 os Alfa TI eram sinônimos de luxo e performance. Pouca gente lembra, mas, lá para o começo dos anos 80, existiu até uma versão TI a álcool com a alimentação da 2300B, maior taxa de compressão e 145 HP SAE, seguindo tendências de mercado. 

Não perca, na coluna da próxima semana, a segunda parte dessa história! 

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Jornalista na área automobilística há 48 anos, trabalhou na revista Quatro Rodas por 10 anos e na Revista Motor Show por 24 anos, de onde foi diretor de redação de 2007 até 2016. Formado em comunicação na Faculdade Cásper Líbero, estudou três anos de engenharia mecânica na Faculdade de Engenharia Industrial (FEI) e no Instituto de Ensino de Engenharia Paulista (IEEP). Como piloto, venceu a Mil Milhas Brasileiras em 1983 e os Mil Quilômetros de Brasília em 2004, além de ter participado em competições de várias categorias do automobilismo brasileiro. Tem 67 anos, é casado e tem três filhos homens, de 20, 31 e 34 anos.