O enigma do Gol caranguejo que só andava para trás


Era meados dos anos 90 em um bairro da zona norte da cidade de São Paulo. O protagonista dessa história, “Seu” Walter, que já partiu dessa para melhor, tinha um Gol comprado zero-quilômetro no final de 1995 “já com o modelo 1996”, como ele gostava de frisar.
Assim como hoje, naquela época, o furto de automóveis era coisa comum: você estacionava o carro, mal se afastava dele e já vinha um larapio pra roubá-lo. Tempos bicudos em que ninguém se arriscava a largar um carro na rua sem as devidas proteções. E olha que, mesmo assim, havia safado sem vergonha que conseguia driblar os antifurtos da época e levar o bem alheio.
Orgulhosamente o Seu Walter, como era mais popularmente chamado, depois de comprar o seu Gol bolinha branco, sabia que aquele era um carro muitíssimo roubado, principalmente os da cor branca. Existiam muitos Golzinho brancos pela rua e isso dificultava a policia encontrá-los.
Por isso, ainda na concessionária onde havia comprado o veículo, pediu para que fosse instalada a então famosa trava Multilock, uma espécie de cadeado crescido que, fixado ao túnel da carroceria, travava a alavanca de mudanças de marchas em marcha-ré ou primeira, dependendo da dificuldade que você quisesse colocar ao ladrão. O trem era reforçado e podia ser liberado através de uma chave exclusiva do equipamento e diferente das demais chaves do veiculo.
Funcionava assim: você parava o veículo e depois de imobilizá-lo com o freio de estacionamento, engatava a primeira ou a ré e fechava a argola que não permitia que o possível ladrão desengatasse aquela marcha escolhida pelo motorista.
De uma maneira geral, a maioria dos motoristas usava o acessório de segurança engatando a marcha à ré. O objetivo era dificultar a vida do ladrão, e era assim que Seu Walter fazia. Em que pese o fato dele ser um aposentado como gerente do Banco Banespa, que também já não existe mais, ele tinha como principal característica o fato de ser meio atrapalhado com as coisas do dia a dia. E nessa atrapalhação, estava inclusa também perder chaves.
Correria por causa do remédio…

Seu Walter, por sua idade já se via obrigado a tomar alguns remédios para manter a boa saúde que tinha. E alguns deles tinham horários corretos para serem tomados. Um desses remédios acabou e ele precisava, urgentemente, ir a drogaria onde costumava comprar seus medicamentos que ficava a cerca de cinco ou seis quarteirões de sua casa.
Seu Walter pegou as chaves do seu amado Gol branco e correu para ir atrás do seu remédio. Ao chegar ao Gol, uma descoberta terrível: onde ele havia colocado a chave da tal trava? Não lembrava e por mais que procurasse, não encontrava. E nisso o tempo ia passando, e o horário do remédio atrasando.
Seu Walter não teve duvidas: ligou o Golzinho branco e partiu rumo a drogaria, mas de marcha à ré. Ele teve que colocar a prova toda a sua destreza ao volante, que ele tanto dizia ter aperfeiçoado nos tempos de jovem, quando afirmava ser um exímio piloto. Venhamos e convenhamos: rodar no trânsito de São Paulo por seis quarteirões na marcha à ré, não é coisa pra principiantes.
Pois não é que o Seu Walter chegou a drogaria, comprou o remédio que já fazia falta ao seu organismo e, de quebra ainda deu um pulinho no supermercado para buscar algumas coisinhas? E deu tanta sorte que sequer cruzou com uma viatura da polícia que poderia ter aplicado ao “Senhor marcha à ré”, uma tremenda multa. Uma coisa de louco!
Depois dessa epopeia, Seu Walter voltou para casa e descobriu que a chave da trava Multilock do câmbio estava no bolso de sua calça. Mas como ele era meio atrapalhado, esse ocorrido foi um fato absolutamente corriqueiro e normal dentro das trapalhadas diárias do simpático senhor.
Seu Walter e suas confusões inesquecíveis, hoje lembradas em risadas por quem o conheceu.