Um Gol Furgão mais especial que muito GTI

Hoje trago um carro que tem na raridade e estado de conservação seus principais pontos. Trata-se de um Gol Furgão 1989, último ano com motor AP, pois a partir do modelo 1990 passou a vir com o AE, de origem Ford. Obviamente não é estética e dinamicamente interessante como um GTi, mas sem dúvida é bem mais raro. O que não foi destruído em serviço, acabou indo para as pistas de arrancada, pois é originalmente aliviado e, com isso, mais fácil de atingir resultados com preparação.

O interior “oco” e leve de fábrica facilitava o uso para competições, já que o carro era leve (Foto: Acervo Pessoal/Alexandre Ule Ramos)

Ainda havia outro detalhe: muitos deles simplesmente foram convertidos em carros normais, devido à facilidade que havia na época de “alterar” os documentos dos veículos. Como o Furgão era muito mais barato, alguns lojistas achavam que valia a pena se valer disso para ter lucro.

Nossa história começa no dia em que fui consertar uma cadeira de escritório, num serralheiro perto de casa. Chegando lá, na porta da serralheria, havia um raríssimo Gol Furgão, com motor AP, um par de racks no teto, pronto para ser destruído no uso pesado do trabalho. O dono me explicou que o carro era dele, comprara de único dono, com pintura de fábrica e apenas 63 mil km no painel.

Lá estava o Golzinho Furgão de único dono e baixa km trabalhando em uma serralheria (Foto: Acervo Pessoal/Alexandre Ule Ramos)

Contava com os dois únicos opcionais para o 1989: bancos em tecido e tampa traseira com vidro. O carro tinha todo o conjunto de iluminação original, rodas datadas, lacrado de frente e traseira e até mesmo com o resquício de uma adesivo de controle de qualidade que a VW punha ao lado da torre dianteira direita da suspensão. No porta-luvas, o manual original e a nota fiscal. Não tinha como deixar passar.

Depois de uma rápida negociação, descobri que nem mesmo no nome dele o carro estava, pois não havia tido tempo de transferir. Deixei um sinal e levamos o carro para um estacionamento, para aguardar a documentação, o que levou cerca de 30 dias. Quando finalmente saiu, o Gol foi para o “spa”, para ser limpo e polido. Foi impressionante o resultado, pois revelou que realmente grande parte da pintura ainda é de fábrica, o que é muito raro levando em conta o caráter utilitário desse carro. No painel ainda havia um adesivo mostrando a placa amarela que ele ostentava quando zero km.

Depois de um trato digno de “spa”, a originalidade do VW foi confirmada (Foto: Acervo Pessoal/Alexandre Ule Ramos)

O Furgão foi lançado oficialmente em 1981, com a chegada do motor 1.6 “a ar” para a linha Gol, e se o meu é um carro raro, essas primeiras unidades são ainda mais. A produção nunca foi grande e quase sempre era fruto de encomendas de grandes empresas, como Sabesp e Correios. Com capacidade para um volume de carga de 1200 litros, já que não contava com nada na parte traseira, nem mesmo os acabamentos junto às lanternas, podia carregar 520 kg de carga útil. Embora a linha Gol 1985, a partir do S, ganhasse motor refrigerado a água, o Furgão continuou com motor a ar. Somente no fim de 1986, já para 1987, ele ganharia o novo propulsor arrefecido a água.

Era um carro bem simples, feito para trabalho, com tapetes de borracha no assoalho dianteiro e traseiro, saídas de ventilação da cabine fechadas nas laterais (isso realmente não dá para entender…), quebra-ventos fixos, bancos com encostos fixos à grade divisória (ou seja, não era possível retirar a grade, sob pena de perder os encostos) e até mesmo espelhos sem comando interno. Os vidros laterais davam lugar a chapas de aço e a tampa traseira com vidro era opcional. Os pneus originais eram verdadeiras “linguiças”, com as medidas 155/80 R13, que não são mais encontrados à venda.

Era um carro feito para o trabalho, como mostram as propagandas da época (Foto: reprodução/VW)

O ano de 1989 marca o último ano do motor AP no Furgão, pois no ano seguinte, e até o fim de sua vida (1994), ele ficaria com o controverso motor AE1600, de origem Ford. Esse motor AP também tem uma curiosidade: ele era chamado de Motor Torque, conforme esclareceu Mauricio Tollendal, da Tollendal Motors, com 23 anos de experiência em VW: “por ser um carro de carga, a VW desenvolveu esse motor com bloco de 1.8 e cabeçote de 1.6, para justamente ter mais torque, já que ele contava com câmbio de quatro marchas”, esclarece ele. Esse câmbio, por sinal, durou até 1990, sendo que a partir do modelo 91 ganhou uma quinta velocidade.

Se continuasse na mão do serralheiro, provavelmente já teria virado sucata (Foto: Acervo Pessoal/Alexandre Ule Ramos)

Hoje, como se sabe, os carros utilitários estão ganhando cada vez mais destaque, pois no exterior a moda pegou. As versões Furgão de carros de passeio, muito raras, ganham as ruas com cada vez mais reconhecimento. Isso sem falar dos Furgões de carga mesmo, como Fiorino e Polo Van. E com isso, o Gol furgão, assim como o Dacon Nick, ficou realmente inesquecível, pois está em casa até hoje. Nessa altura do campeonato, se estivesse trabalhando na serralheria, já teria virado sucata faz tempo…

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Alexandre Ule Ramos é jornalista há 34 anos, formado na Cásper Libero, de São Paulo, e também em Publicidade e Propaganda pela Metodista, de São Bernardo do Campo. Durante muitos anos foi responsável pelo setor de usados do Guia Melhor Compra da revista Quatro Rodas, trabalhou na revista Oficina Mecânica e Hot, teve passagens pela revista Carro, Brasil Transportes, Fúria, Superauto, produziu conteúdo para o Webmotors, Auto+, Feira Livre do Automóvel etc. Tem enorme conhecimento no mercado de carros usados, trabalhando há mais de 22 anos com compra, venda e consultoria de veículos. Já adquiriu mais de 1.000 carros durante essas mais de duas décadas, e, até hoje, permanece ativo na sua função.