VW Saveiro: a picape do Gol em sua primeira fase (1982/1986)


Derivada do VW Gol, a pick-up Saveiro foi lançada em junho de 1982 e surfava na onda das caminhonetes pequenas baseadas em carros compactos. Podia carregar até 570 kg, trazia 870 litros no espaço da caçamba e tinha proposta de ser um carro de campo e de cidade, multiuso: oferecia até um espaço da cabine, atrás do banco do motorista, para uma mala pequena. Até as propagandas da época mostravam seu perfil profissional e de lazer, com apelo especial a pegada jovem.
Seu design, similar ao da Parati, era moderno, encantando imediatamente ao público, que viu nela um carro moderno e com ar esportivo, por mais que esta não fosse a proposta. Além disso, tinha dirigibilidade muito próxima a do hatch Gol, experiencia até então incomum para os carros desta categoria.
Curiosamente, não tinha pneu estepe no compartimento do motor, e sim atrás do banco do passageiro, dentro da cabine. Ali havia um ressalto na lataria, possibilitando o alojamento, mas, mesmo assim limitava o espaço já contido de motorista e passageiro. A mesma solução é encontrada hoje na dupla Fiat Fiorino/Peugeot Partner Rapid.
Outro ponto incomum para uma picape era a concepção da suspensão traseira. Não era como nas rivais Fiat City e Ford Pampa, pois tinha molas helicoidais de ação progressiva com amortecedores recalibrados, muito similar ao sistema da Parati. Era robusto, tanto que permitia os 570 kg de carga, mas com um efeito colateral quando carregada: sua traseira “arriava”, a frente inclinava muito, e, dependendo do piso, a tração dianteira ficava comprometida. O público jovem não ligava para isso, afinal, a Saveiro era descolada, e era vista com mais frequência na porta das faculdades, restaurantes ou baladas.

Por estratégia da marca, e de algum diretor de produto, a Volkswagen do Brasil entendeu que o Gol deveria usar o cultuado motor a ar do Fusca, e isso quase fez com que ele saísse de linha 1 ano depois, pelas críticas do mercado e baixas vendas. Falo do ultrapassado boxer 1300 cilindradas, com 50 cv de potência SAE a 4600 rpm (36 cv ABNT) e 9,2 kgfm de torque a 2800 rpm, que, no Gol, decepcionava com 0 a 100 km/h em 30,27 segundos e velocidade máxima de 124 km/h na melhor passagem dos testes da Revista Quatro Rodas da época (sim, se considerar a média, era ainda mais lento).

Mas já em 1981 o Gol ganhou o motor 1600, ainda a ar, do Brasília. Com dupla carburação, era ele que também estava presente na primeira Saveiro, a etanol (51 cv a 4400 rpm e 10,5 mkgf a 3000 rpm) ou a gasolina (54 cv a 4600 rpm e 10,9 mkgf a 3000 rpm). A transmissão manual tinha quatro marchas de série. Por conta do maior torque e melhor alimentação, esse 1600 garantia um desempenho mais condizente na picape: oficialmente, a VW falava em 11,4s na prova de 0 a 80 km/h e 18,1s no 0 a 100 km/h na versão a gasolina, ou então 11,9s e 19,4s na versão a álcool. Atingia 134 km/h de máxima com o combustível fóssil, ou então 131 km/h com o derivado da cana.
Em teste realizado pela revista Quatro Rodas em outubro de 1982, a Saveiro 1600 a gasolina conseguiu a “surpreendente” aceleração de 0 a 100 km/h em 16,89 segundos e 141,038 km/h de velocidade máxima. Ainda foi elogiada pelo consumo de 10,26 km/l na cidade e 15,45 km/l na estrada, vazia nos dois casos, mostrando bons números à ocasião. Apesar disso, era de se estranhar o uso do antigo motor boxer a ar na picape, afinal a perua Parati e o sedan Voyage já vinham com BR 1.5 e BS 1.6, ambos mais modernos e arrefecidos a água.

Disponível nas versões S e LS, as mesmas do Gol, a Saveiro trazia os mesmos equipamentos do hatch, e os dois se diferenciavam por mudanças sutis de acabamento interno. Na básica S, os bancos eram de courvin, não tinha retrovisor do lado do passageiro, e o esguicho do limpador do para brisas era uma bomba a vácuo acionada com o pé. No painel, apenas informações básicas como velocímetro, odômetro total até 99.999 km, marcador de combustível e luzes-espia.

A mais completa LS tinha bancos revestidos em tecido, carpete no assoalho, retrovisor dos dois lados, encosto de cabeça, protetor do vidro traseiro, relógio no painel de instrumentos, econômetro, hodômetro parcial, lavador elétrico do parabrisas, ventilador elétrico de 2 velocidades (criticado por seu barulho), limpador de para brisas com temporizador, acendedor de cigarros e espelho de cortesia no para-sol do passageiro. Opcionalmente, podia vir com pintura metálica, retrovisor com regulagem interna e, a partir de 1983, rodas de liga-leve.
No final de 1984, já na linha 85, o modelo, apelidado pela Volks de “cavalo para todas as batalhas”, recebia finalmente motor refrigerado a água: era o 1.6 MD-270, com carburador de corpo duplo, de 72 cv de potência a gasolina (81 cv se fosse a etanol) a 5200 rpm e 12,8 kgfm de torque a 2600 rpm (12,0 mkgf se fosse a etanol), dando mais agilidade a picapinha. Seus números de desempenho melhoraram: a VW declarava 0 a 80 km/h em 8,2s e 0 a 100 km/h em 12,8s com etanol (máxima de 156 km/h), ou então 9,0s e 14,4s, respectivamente, com gasolina. Com combustível fóssil, atingia os 150 km/h.

Naquela ocasião também estreava na picape a frente da linha Gol a água, com faróis maiores, parachoques mais envolventes e dianteira mais imponente.

No final de 1985, ainda com câmbio de quatro marchas, a picape trocava o 1.6 MD pelo então moderno e hoje cultuado AP-600, uma evolução em todos os sentidos. Passava a ter 85 cv com etanol e 76 cv com gasolina, e mais uma vez ela melhorava na performance: dados de fábrica indicavam 12,5s para ir de 0 a 100 km/h com etanol ou 13,6s com gasolina, obtendo velocidade máxima um pouco maior (151 km/h com gasolina e 157 km/h com etanol). Apesar da limitação da transmissão de quatro marchas, a picape do Gol enfim deslanchava em vendas e assumia a liderança de sua categoria.

Na mesma época, alguns concessionários da VW e oficinas independentes passaram a instalar o motor a diesel da Kombi, já na versão MD-270, à pick-up Saveiro, tanto em veículos novos e usados, já que as especificações permitiam. No caso de veículos novos, os concessionários mantinham a garantia para todo o veículo, e não só para o motor (leia mais aqui).
A partir de 1987, as versões da linha VW eram renomeadas (até então, a Saveiro ainda era vendida nas configurações S e LS), e o sucesso da picapinha apenas aumentava. Mas esta história eu continuo mais para frente. Só para lembrar, a VW Saveiro é o veículo mais antigo em produção contínua no Brasil: seus 43 anos de história precisarão ser divididos em outras colunas.
