Ford Belina 4×4: o primeiro e último wagon compacto nacional com tração nas 4 rodas
Em 1970, foi apresentada a versão station wagon do Ford Corcel, chamada de Belina. Considerado moderno para seu tempo, teve grande sucesso, e concorria diretamente com o VW Variant.
Nas versões Standart e Luxo especial, trazia motor 1.3 de 68 cv SAE (aproximadamente 57 cv ABNT) a 5200 rpm com 9,8 kgfm de torque a 3200 rpm, capaz de levar o station wagon de 0 a 100 km/h em 24 segundos e a 129 km/h de velocidade máxima, números respeitáveis àquela época.
Seus grandes trunfos eram o espaço interno, com 380 litros de capacidade em seu porta-malas, e baixo consumo, com médias de 10 km/l na cidade e 13,4 km/l na estrada.
Acompanhando o mercado e as evoluções de seus irmãos Ford Corcel Cupê e Sedan, recebera em 1973 nova frente e um motor mais possante, antes usado no Ford Corcel GT XP. Agora 1.4 litro, 75 cv SAE (aproximadamente 63 cv ABNT) a 5400 rpm e 11,6 kgfm de torque a 3600 rpm. Mais bonito, mais potente e mantendo as boas médias de consumo, aumentou ainda mais sua participação no mercado, carente de “peruas”.
Em 1977, a Ford apresentou a sua segunda geração para a linha 1978, intitulado Ford Belina II, muito mais espaçoso e com design moderno à época, virando o queridinho das famílias que precisavam de muito espaço para viagens. Assim, foi líder do segmento até a chegada do VW Voyage Parati em 1982.
Com uma suspensão extremamente confortável e estável, usava o mesmo motor 1.4, mas com evoluções na carburação e na curva de torque. Passava a 78 cv SAE (68 cv ABNT) a 5400 rpm, com 11,5 kgfm de torque a 3600 rpm, e com praticamente as mesmas médias de consumo, mas com a carroceria mais pesada, perdia em desempenho para seu concorrente de peso (literalmente), o GM Caravan 2.5.
Para a linha 1980, o problema de desempenho era solucionado com o motor 1.6 de 90 cv SAE (76 cv ABNT) a 5600 rpm, 13 kgfm de torque a 4000 rpm e médias de consumo ainda similares, sendo assim consideradas melhores ante o aumento significativo de potência.
O Belina ainda era o queridinho das famílias, e a Ford sabia muito bem disso. Após o lançamento do Ford Del Rey em 1981, o station wagon ganhou uma versão luxuosa em 1982, a qual foi chamada de Ford Scala, com feições de Del Rey e muito luxo a bordo.
Com acabamento superior, introduziu equipamentos inéditos à categoria: travas e vidros elétricos, console de teto com relógio digital, luzes de leitura e um painel que trazia até manômetro que informava a pressão do óleo. O ar-condicionado era opcional, assim como o câmbio automático de 3 velocidades.
Com a chegada do motor CHT em 1983, toda a linha passou a ter mais fôlego, afinal, com gasolina, eram 73 cv ABNT a 5200 rpm e 10,3 kgfm de torque a 2800 rpm, melhorando sensivelmente seu consumo. Com etanol, fazia 8,1km/l na cidade e 9,8km/l na estrada.
Pioneirismo do 4×4
Em 1985, um ano após o lançamento do Ford Pampa 4×4 (leia mais aqui), a Ford lançou o Belina 4×4, sendo o primeiro station wagon derivado de carro de passeio a contar com tração nas 4 rodas fabricado no Brasil. Simultaneamente, recebeu um facelift, com nova frente e mudanças no interior.
Com foco dirigido a fazendeiros e moradores das áreas rurais, o Belina atendia bem a esse público, que percorria estradas ruins e precisava também andar pelo asfalto. É claro que atendia também aos “civis”, que usavam o carro na cidade, mas que gostavam de enfrentar terra e lama quando necessário.
Com pneus Pirelli Cinturato MS 175 SR 13, de perfil fora-de-estrada, a dirigibilidade era ótima na terra e na chuva, mas desconfortável na estrada de asfalto, pois graças a maior espessura da borracha, provocava oscilações transversais, ocasionando instabilidade direcional. Acima de 120km/h por exemplo, a condução do Belina era desagradável graças ao curto entre eixos, o que não ocorria no Ford Pampa com o mesmo sistema de tração.
Usando outro tipo de pneus, como os Firestone Town and Country, definidos como 30% cidade e 70% campo, a sensação era amenizada, mas muitos proprietários colocavam os pneus para asfalto, como os Pirelli P44 na medida 185/70R13. Com eles, o carro ficava bastante confortável para o asfalto, porém inapropriado para o uso fora dele, o que eliminava as vantagens de se comprar a versão 4×4.
O sistema 4×4, quando ativo, tinha alguns inconvenientes, como por exemplo a velocidade limitada a 60 km/h a fim de evitar desgastes dos componentes. Outro ponto era que a tração nas quatro rodas só deveria ser usada em terrenos de baixa aderência, como lameiros, e isso, a princípio, não foi bem explicado no manual. Não havia também sincronismo entre as rodas dianteiras e traseiras, o que só reduzia seu desempenho.
Equipada com o motor CHT 1.6, câmbio manual com quatro marchas e relações curtas, não passava de 140 km/h de velocidade máxima e ia de 0 a 100 km/h em 20,99 segundos, enquanto um Belina “comum” equipado com câmbio de 5 velocidades chegava a 143,038 km/h e ia de 0 a 100 km/h em 17,57 segundos.
Muito robusto no Ford Pampa, o sistema 4×4 era problemático no Ford Belina, como comprovou a Revista 4 rodas em março de 1987. Após rodar 50.000 km, a tração nas 4 rodas funcionou bem até 10.000 km, e daí para frente, o teste foi considerado penoso, e o modelo foi definido como inapropriado para o uso a que era destinado.
Quando o modelo foi lançado, seu slogan era: “A Belina 85 saiu da estrada. A Belina 4×4 chegou para oferecer o conforto já conhecido e mais liberdade que só um 4×4 pode oferecer”. Isso frustrava seus usuários, que não conseguiam usá-la como um veículo moderno, pois a tração servia apenas em emergências, como por exemplo sair de um atoleiro.
Verdade seja dita: no manual era explicado que “a utilização da tração 4×4 deve-se limitar ao essencialmente indispensável, como em terrenos íngremes, lamacentos e arenosos”. E ainda assim, com duas advertências: “procure engrenar a tração 4×4 somente com as rodas dianteiras alinhadas para a frente” e “não ultrapasse a velocidade de 60 km/h estando com a tração nas quatro rodas acionada”. Para acionar o sistema, o veículo precisava estar totalmente parado.
Comparado com os modernos modelos 4×4 fabricados no exterior, em que a tração já àquela época era usada de forma integral ou acionada com o veículo em movimento, o Belina surpreendia de forma negativa seus proprietários, que liam apenas os materiais publicitários, e não os manuais.
Uma falha no marketing, na comercialização pelos vendedores e mesmo na entrega técnica findou a vida do station wagon de tração nas quatro rodas, que saiu de linha como Belina Del Rey 4×4 em meados de 1987, logo após a Ford ter unificado sua linha de SWs, eliminando o nome Scala e integrando o Belina à linha Del Rey.
O fiasco comercial do modelo 4×4 não abalou a imagem do Ford Belina, que na mesma época chegou ao seu auge. Mesmo com modelos mais potentes e mais espaçosos na concorrência, tinha seu público cativo graças ao acabamento esmerado e suspensão extremamente confortável.
A partir de 1989, recebia o motor VW intitulado para a Ford como AP-1800, tendo a maior potência de fábrica em sua carreira. Eram 93 cv com etanol a 5200 rpm, com 15,5 kgfm de torque a 2800 rpm, capaz de levar o confortável station wagon de 0 a 100km/h em 14,8 segundos e alcançar os 154 km/h de velocidade máxima.
No mesmo ano, era lançado o GM Kadett Ipanema, em um mercado concorrido que contava também com os modernos VW Parati, então líder do segmento, VW Quantum, Fiat Elba (que recebia a versão de 4 portas), além do velho de guerra GM Caravan.
A produção do station wagon do Corcel durou até 1991, quando o modelo foi descontinuado para dar lugar à Ford Royale em 1992, fruto da joint-venture Autolatina.