VW Golf GTE era o sucessor (quase) perfeito do GTI. Mas não deu certo…


São quase 72 anos de Volkswagen no Brasil, e o aniversário está próximo (23 de março). Nessas mais de sete décadas, muita coisa de sucesso, desde carros até caminhões. Porém, claro, existem aqueles produtos que caíram no ostracismo, ficaram esquecidos no tempo. Bom exemplo? VW Golf GTE, que chegou por aqui em novembro de 2019 como um belo pioneiro: foi o primeiro carro eletrificado da marca em solo nacional. No caso, híbrido plug-in. Porém, bem antes disso, desde abril, já era confirmado pela VW.

Absolutamente nada contra o carro, que, inclusive, era excelente e cheio de qualidades. Estreava a tecnologia híbrida plug-in da fabricante alemã em solo nacional, lembrando que não houve mais nenhum VW com esse tipo de eletrificação por aqui. Isso há quase seis anos, bem antes da “explosão” dos chineses e da popularização dos PHEV. Importado da Alemanha, o GTE chegou atrasado: o Golf de sétima geração já estava em fim de carreira no Brasil, tanto que sobrevivia de estoques antigos. A versão esportiva GTI foi a última a ser oferecida, até outubro de 2019.

Ou seja, o GTE fez “renascer” o bom e velho Golf 7 no Brasil, e ele ainda tinha pretensões de vir suceder o lendário GTI. Mecanicamente, tinha (quase) tudo para tal: unia o consagrado motor 1.4 16v TSI, turbo e com injeção direta de gasolina, entregando seus 150 cv de potência e 25,5 mkgf de torque, a um motor elétrico dianteiro, instalado quase junto a transmissão. No caso dele, falamos de outros 102 cv e 33,6 mkgf de força imediata, distribuídos sempre para as rodas da frente. Tinha tração dianteira, tal qual seu irmão GTI, movido pelo 2.0 turbo da família EA-888.

Somados 1.4 turbo e motor elétrico, a VW falava em exatos 350 N.m. de torque, ou 35,7 mkgf, exatamente o mesmo gerado pelo GTI. A transmissão automatizada DSG de seis velocidades ganhava uma terceira embreagem, para lidar com o propulsor elétrico, mantendo a agilidade nas trocas. Era a DQ400E, dedicada aos modelos eletrificados.
Embora tivesse quase 1.530 kg na balança, ou quase 200 kg a mais que o GTI (120 deles só das baterias de tração), o GTE era rápido para a época: demorava 7,6 segundos para ir de 0 a 100 km/h, e atingia a boa velocidade máxima de 222 km/h, superior à de muitos híbridos modernos. Tudo graças aos 204 cv de potência declarada, além da aerodinâmica melhorada com parachoque dianteiro exclusivo, grade ativa (abertura e fechamento automáticos), rodas especiais (aro 16) e pneus com baixa resistência ao rolamento (Continental ContiEcoContact).
Apesar da tecnologia plug-in, que permite carregar o carro em fontes externas, o GTE nunca teve baterias grandes: eram 8,7 kWh de capacidade, e o “pacote” de acumuladoras ia instalado sob o banco traseiro, onde, originalmente, ficava o tanque de combustível nos demais Golf. Onde ia parar o tanque? Debaixo do assoalho do porta-malas, na região do eixo traseiro. Por isso, tanto o espaço para gasolina quanto o das bagagens diminuíam: eram 40 litros no tanque (50 num GTI) e 272 litros para as malas (338 num GTI).

Pelo menos, a VW declarava que o Golf GTE conseguia rodar até 50 km apenas no modo elétrico, sem queimar gasolina alguma. Na teoria, permitia que muitos brasileiros cumprissem suas rotinas de trânsito urbano sem gastar gasolina. A marca ainda comemorava que, com um tanque cheio e carga completa das baterias (que demorava 2h45min, oficialmente), o hatch médio eletrificado percorria até 940 km. Para a época, muito promissor.

E, graças ao modo de condução esportivo GTE, que aprimorava desde direção até amortecedores, despejando toda a potência e força possíveis, ele tornava-se tão ágil e esperto quanto seu irmão recém-aposentado GTI. Bebendo bem menos gasolina, ainda. Também havia o modo 100% elétrico (permitia viajar com ele sem gastar gasolina a até 130 km/h), o híbrido (mesclava combustão e eletricidade da melhor forma), e recarga (mantinha o 1.4 turbo ligado como gerador, para carregar as baterias).

Mas, até aí, bacana! Um hatch médio rápido, com tecnologia plug-in, ótimas promessas de consumo de combustível, alta eficiência energética e a meta de poupar o bolso do proprietário da gasolina da época, que rondava os R$4,15/litro. Onde estava o erro? Para começar, no fim de ciclo do Golf 7. O consumidor tinha em mente que o modelo havia saído de linha no mercado nacional, o que, de fato, havia acontecido um mês antes. O GTE veio quando todos os seus irmãos já tinham ido embora. Por mais que mostrasse vantagens, tinha o fator “novidade” prejudicado.
Além disso, a própria VW trouxe o Golf híbrido plug-in da Alemanha em baixas quantidades. De início, veio um lote de aproximadamente 100 carros, e a marca declarava que, se houvesse demanda, traria mais. Isso não ocorreu. As propagandas foram fracas na época, e apenas três cidades do Brasil tinham concessionárias da marca que o vendiam e revisavam: São Paulo (SP), Curitiba (PR) e Brasília (DF). Fora desse eixo, o carro só chegaria através de lojistas independentes, ou já usados, vendidos por terceiros. Limitado, não?

Mas, sem dúvidas, o que mais complicou a vida do GTE foi o preço. Era salgado, e muito. O GTI 2.0 turbo se despediu do mercado pouco tempo antes por cerca de R$151 mil, e algumas unidades ainda eram encontradas à venda com descontos. O híbrido plug-in cobrava caro por suas tecnologias, e chegou beliscando os R$200 mil. Era o mesmo cobrado por um Audi A3 Sedan topo de linha, com tudo que tinha direito, incluindo o motor 2.0 turbo do GTI. Complicado…
Vá lá, ele tinha bons conteúdos de série, para tentar compensar. Teto-solar panorâmico, ar-condicionado digital automático de duas zonas, piloto automático adaptativo (ACC), alerta de colisão frontal, frenagem autônoma de emergência, banco do motorista com ajustes elétricos e memória de posição, controle eletrônico de descidas, retrovisor interno fotocrômico, sensores de chuva e crepuscular, painel de instrumentos digital de 12,3”, multimídia de 9,2” e por aí vai. Não havia opcionais, mas dois acessórios chamavam a atenção: bicicleta e patinete elétricos, com autonomia ao redor dos 25 km cada, que podiam ser adquiridos juntos do carro.
O tal primeiro lote, com cerca de 100 carros, continha unidades fabricadas em 2019, de modelo 2020. Todas eram da mesma cor: Azul Atlantic, um bonito tom marinho metálico, lembrando o roxo. O problema é que, poucos meses depois, veio a pandemia de COVID-19, e suas vendas, que já não iam bem, declinaram. O destino da maioria desses quase 100 Golf GTE importados acabou sendo…as locadoras!

Pulamos para novembro de 2020, quando a pandemia já assolava o planeta. A VW, cheia de GTE’s “velhos” no estoque, fechou acordo com a Unidas, uma das maiores do ramo de aluguel de veículos no Brasil. Na época, a empresa locadora confirmou ter adquirido pelo menos 57 exemplares do hatch híbrido plug-in. Entretanto, fontes dizem ter sido mais…

Esses carros só poderiam ser alugados por prazos curtos em São Paulo, Curitiba ou Brasília, cidades que tinham concessionárias aptas a mexer neles. Só nos planos mais longos, de 12 até 48 meses, ou então no caso de locação para frotas de empresas, era possível ter o GTE em outras localidades. Não se sabe exatamente até quando esses Golf plug-in rodaram com a Unidas no esquema de aluguel, porém, de acordo com o DENATRAN, 99 unidades ainda seguem em circulação pelo país. Boa notícia!

Ah, e alguns GTE que integravam a frota interna da Volks acabaram indo parar no SENAI no começo de 2022. Na ocasião, a fabricante fechou um contrato de empréstimo de dois anos com a instituição nacional, cedendo carros para servirem de “cobaias” e elementos de estudo para jovens em formação, principalmente aqueles que cursavam mecânica ou eletricidade automotiva. Passado o prazo de cessão dos carros, não há notícia do paradeiro deles, mas, por via de regra, costumam virar sucata.

Esse GTE seria o último suspiro do Golf no mercado nacional. O fato é que, de (caro) pioneiro na eletrificação da VW do Brasil, o Golf GTE passou para fracasso retumbante em questão de meses. Esquecido, precisou ser “queimado” em um lote para locadoras, e hoje só é lembrado em matérias de “volta ao passado”, como essa. Ou então, quando aparece alguma das tais 99 unidades rodando por aí.
Enquanto isso

O Golf GTI vai voltar ao Brasil após esses quase seis anos de hiato, e essa informação já foi confirmada pela Volkswagen. É outra geração, a oitava, já passada por uma reestilização visual. Sob o capô, o veterano 2.0 turbo EA-888, agora recalibrado para altos 265 cv de potência e quase 38 mkgf de torque, que promete trazer de volta a alegria de alguns fãs do modelo país afora. Mas o GTE de sétima geração, esse já virou passado…