VW Gol GT: o primeiro com motor refrigerado a água

O Volkswagen Gol é sucesso inegável: vendeu, ao todo, mais de 8.500.000 unidades no Brasil e em alguns países do mundo em seus 42 anos de fabricação. É o carro nacional que mais emplacou, e vai manter este recorde por uns bons anos.  

Com design moderno para seu tempo, o hatch chegou em maio de 1980 causando grande expectativa, mas quase “bateu na trave”. Seu antiquado motor boxer 1300 (igual ao do Fusca), mesmo retrabalhado com elementos Porsche para se instalar na dianteira, desenvolvia apenas 50 cv de potência SAE (parcos 36 cv ABNT), o que decepcionava toda a torcida com um interminável 0 a 100 km/h em 30,27 segundos e pífia velocidade máxima de 124 km/h, de acordo com testes da Revista Quatro Rodas da época. Eram dados considerados tímidos até para modelos “populares” da época. 

Além disso, o Golzinho a ar ainda era beberrão, percorrendo, com gasolina, 9,13 km/l na cidade e 12,28 km/l na estrada. Nem mesmo o lançamento da versão movida a etanol, com 6 cv SAE a mais, ajudou nas vendas do VW, que seguiam muito modestas. O carro “tomava couro” até de Fiat 147 1050 no consumo e desempenho (19,47s de 0 a 100 km/h e 136 km/h de máxima). 

O primeiro teste da Quatro Rodas mostrou o quanto o Gol ficou lento com aquele motor: demorava mais de 30 segundos no 0 a 100 km/h (Foto: Cláudio Larangeira/Quatro Rodas)

Sua situação foi revertida em 1981 com o lançamento do Gol 1600, agora sim com interessantes 66 cv SAE a 4400 rpm (50,5 cv ABNT) e 10,5 kgfm a 3000 rpm. O desempenho do Hatch da VW tornava-se mais condizente com sua proposta, e agora praticamente não devia mais nada para a concorrência: dados de testes da Revista Quatro Rodas indicavam 0 a 100 km/h em 16,57s com 145,749 km/h de velocidade máxima. 

As vendas melhoraram bastante e o Gol foi ganhando a fama que fez dele o carro mais vendido do Brasil. As versões especiais ajudaram bastante nesse processo de consolidação de seu nome, e, como bom exemplo, temos a esportiva GT. 

As versões especiais, a exemplo da esportiva GT, sem dúvidas ajudaram a consolidar o sucesso do Golzinho no Brasil (Foto: VW/divulgação)

O mercado ansiava pela chegada do Gol com motor refrigerado a água, afinal seu sedan Voyage, lançado em 1981, e a perua Parati de 1982 já usavam o excelente motor VW BR 1.5 a água que moveu o Passat por anos. A Saveiro estreou em 1982 também com motor 1.6 Boxer refrigerado a ar, e, assim como o hatch Gol, destoava do restante da linha: a essa altura do campeonato, Voyage e Parati já recebiam o novo MD-270, uma evolução do motor BS 1.6.  

Nos idos de 1984, era lançado o Passat Plus, dotado do primeiro motor de 1800 cilindradas da marca, intitulado VW 1.8. Antes mesmo de ir parar no Santana (maio de 1984), apareceu na primeira versão esportiva do Gol, a GT (abril de 1984). Esse foi o primeiro, e tão esperado, Gol a água da história. A VW se orgulhava do trabalho, afinal esse 1.8 era praticamente o mesmo utilizado pelo Golf no exterior. No Gol GT, tinha a missão de derrubar a hegemonia do recém-lançado Ford Escort XR3. Esse desafio foi concluído sem dificuldades, aliás. 

Considerado surpreendente pelas revistas especializadas da época, o Gol GT trouxe um desempenho desconhecido para um hatch compacto. Seu motor desenvolvia 99 cv de potência declarada a 5400 rpm e 14,96 kgfm de torque a 3200 rpm, com o 1.8 acoplado a uma transmissão manual de 4 velocidades. No caso, para pagar menos imposto, a VW sacrificava a ficha técnica, mas, na realidade, eram 106 cv. Este sim fazia jus a esportividade, graças ao comando de válvulas mais brabo. 

Seu 1.8, na realidade, entregava 106 cv de potência, mas a VW decidiu declarar 99 cv para pagar menos impostos na época (Foto: VW/divulgação)

Seu desempenho fazia jus à sigla esportiva, correndo de 0 a 100 km/h em 10,7s, percorrendo 1 km em 33,32s e atingindo a velocidade máxima em pista de 178,052 km/h, segundo dados do seu primeiro teste na Revista Quatro Rodas. Considerando sua aerodinâmica similar à de um tijolo, e a falta, até então, de aerofólio, os números surpreendiam, sendo similares aos do GM Opala 4.1.  

No consumo, usando etanol, chegaram a 6,39 km/l na cidade e 10,73 km/l na estrada, números equiparáveis aos de alguns veículos flex atuais com injeção eletrônica multiponto. Um carburador 2E de dois estágios desenvolvido pela Solex-Brosol garantia a alimentação. Como cereja do bolo, estava o famoso comando de válvulas 49G, o mesmo adotado pelo primo alemão VW Golf GTi. Ele mantinha as válvulas de admissão abertas por mais tempo e com mais espaço, admitindo uma maior quantidade da mistura ar/combustível, responsável por melhores potência e desempenho. 

Comando especial 49G, alimentação por carburador de dois estágios e outras tecnologias no 1.8 (Foto: Marco de Bari/Quatro Rodas)

Bastante durável, o motor 1.8 era dotado de uma válvula instalada na base do filtro de óleo. Sua função, quando desligada a ignição, era fechar a passagem do óleo, impedindo seu escoamento para o cárter. Com isso, assim que o motor fosse religado, ele evitaria o funcionamento por alguns instantes sem lubrificação na parte superior. Talvez isso justifique o porquê da linha de motores VW 1.8 e AP ser tão resistente se comparada aos motores rivais da época. 

No Gol GT, o escapamento produzia um som grave, graças também a tubos de maior diâmetro. Testes da Quatro Rodas acusavam 82 decibéis, na época. Logo este escapamento especial passou a ser vendido como acessório, e até mesmo os proprietários das versões refrigeradas a ar passaram a utilizá-lo. Convenhamos, o som ficava igualmente bom. 

Além das cores metálicas, eram destaque os faróis adicionais, rodas de liga e a dianteira diferenciada, por conta do motor a água (Foto: VW/divulgação)

O GT era identificado externamente por suas cores, fosse vermelho, preto, branco, prata ou bege metálico, além dos faróis de milha, spoiler frontal, grade na cor do veículo, frisos laterais, adesivos alusivos nas laterais, carenagem na coluna B acompanhada de um adesivo preto vinílico na porta, retrovisores externos com regulagem interna. Tinha ainda limpador e desembaçador traseiro, adesivo “GT” no vidro traseiro, acabamento preto entre as lanternas traseiras, além dos emblemas especiais na tampa do porta-malas (“GT 1.8”).  

Painel era o mesmo dos demais Gol, porém mais completo e refinado (Foto: VW/divulgação)
Bancos Recaro e laterais de portas exclusivas (Foto: VW/divulgação)

Além dos vidros verdes, era de série instrumentação completa (conta-giros, marcador de temperatura, marcador de combustível, velocímetro até 190 km/h, luzes-espia, econômetro e indicador de troca de marchas), iluminação e grafismo dos instrumentos em vermelho, volante esportivo de 4 raios (emprestado do Passat TS), console com relógio e cronômetro digitais, bancos RECARO com padronagem exclusiva de tecido, sem contar os porta-objetos nas laterais de portas, rádio toca-fitas AM/FM estéreo, antena e rodas de liga leve aro 14 com pneus 185/60 (as famosas “Snowflakes”). 

Um dos seus destaques era a pequena tela digital no console, que oferecia relógio, cronômetro e data. Destaque para o emblema “GT” vermelho fixado no painel (Foto: VW/divulgação)

Logo era lançada a transmissão de 5 velocidades, e na linha 1985, o painel recebia marcação de até 220 km/h e volante Ligier (mais conhecido popularmente como “4 bolas”). Também entrava em cena o cultuado motor AP-800, com evoluções técnicas incorporadas a toda linha após o lançamento do Santana Quantum. Sua potência não mudava, mas o AP respirava melhor e estava mais atualizado na concepção. 

Lá pelos idos de 1986, o Gol GT era referência e rendia boa briga com o Escort XR3 e GM Monza S/R, principalmente. Mas, mesmo assim, a Volkswagen trazia mudanças para toda a linha, incluindo o hatch esportivo. Na metade do ano foi apresentada a linha 87 do Golzinho, já trazendo seu segundo facelift externo (interior mantido).

Usando a brecha do plano Cruzado, a VW renomeou seus produtos, e criou assim, “novos carros”. O Gol BX foi descontinuado em novembro, substituído pelo Gol C (leia mais aqui), o Gol S virou CL, o LS virou GL, o Plus também foi descontinuado, e o GT virou GTS. Mas essa é outra história, que contarei em detalhes mais à frente… 

Primeiro GT, depois GTS: seria a versão esportiva a responsável por dar brilho ao hatch da VW? (Foto: VW/divulgação)
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Leonardo França é formado em gestão de pessoas, tem pós-graduação em comunicação e MKT e vive o jornalismo desde a adolescência. Atua como Consultor Organizacional na FS-França Serviços, e há 21 anos, também como consultor automotivo, ajudando pessoas a comprar carros em ótimo estado e de maneira racional. Tem por missão levar a informação de forma simples e didática. É criador do canal Autos Originais e colaborador em outras mídias de comunicação.