Mazda RX-7 com motor Wankel: esportivo japonês com coração alemão

Minha expectativa era grande, afinal de contas sempre havia lido sobre o motor Wankel na teoria. Mas nunca tinha visto um ao vivo, instalado em um carro ou mesmo em uma bancada. No início de 1992, a Doral Motors, importadora de veículos da época da abertura das importações, ofereceu para a revista Quatro Rodas um Mazda RX-7, equipado com o tal motor Wankel, numa configuração biturbo com 255 cv de potência. Fui o designado para avaliá-lo, que serviu como capa da edição de agosto daquele ano.  

Vendido no mercado norte-americano, o carro que chegava aqui no Brasil trazia a configuração dos EUA (a famosa “US Spec”), com velocímetro em milhas por hora, posição de guiar do lado esquerdo, e equipamentos dedicados ao público das terras do Tio Sam, como airbag frontal duplo e piloto automático. Lá nos EUA, custava US$35 mil, chegando aqui no mercado nacional por quase o triplo: US$90 mil, equivalentes a quase R$500 mil atuais. Claro, nesse valor, já estavam embutidos os impostos de importação, custo do transporte, lucro de todo mundo e por aí vai.  

As unidades que desembarcaram por aqui eram US Spec e custavam US$90 mil na época (Foto: divulgação Mazda)

O foco estava nessa tecnologia de motores, e todo o trabalho que a Mazda havia feito em cima do motor Wankel ao longo de alguns anos, mais especificamente desde o final dos anos 70, quando chegou o primeiro RX-7. A evolução da tecnologia na mão dos japoneses deu muito certo, tanto que, em 1991, eles mostraram ao mundo todo o seu poderio com esse tipo de motor vencendo as 24 de Le Mans, maior prova de resistência do automobilismo mundial. 

O foco da novidade estava na tecnologia do motor Wankel, que havia conquistado a Le Mans de 1991 (Foto: divulgação Mazda)

Nos anos 80, os motores rotativos já não atraíam mais a atenção dos fabricantes de automóveis, já que o elevado consumo de combustível e altas emissões de gases poluentes complicavam sua vida, especialmente na Europa. Mas os engenheiros da Mazda sabiam que tinha como melhorá-lo: trabalharam em uma admissão mais eficiente e desenvolveram turbocompressores que, aí sim, fizeram com que a potência subisse e as emissões de poluentes reduzissem. No caso do RX-7, um turbo menor garantia o torque nas baixas e médias rotações, enquanto outro maior fornecia força nos altos regimes. Casamento perfeito!

Ainda que não fossem mais tão populares, os motores Wankel foram muito explorados, e aperfeiçoados, pela Mazda (Foto: divulgação Mazda)

Outro problema sério do Wankel, criado lá no final dos anos 20, é que as pontas do triângulo, que funcionavam como anéis vedadores nos motores convencionais, se desgastavam com certa facilidade. Com isso, eles perdiam rendimento. Novos materiais resolveram o problema ao longo dos anos: logo foram sanados os percalços de durabilidade e resistência. Em contrapartida, os custos de fabricação desses motores iam para as alturas. Ainda assim, os japoneses apostaram fortemente nessa tecnologia, que seguiu em desenvolvimento e produção até 2012, quando saiu de linha o último RX-8, sucessor do RX-7. 

E eles não desistiram: hoje produzem um SUV híbrido que usa um pequeno motor Wankel como gerador para baterias de tração, e já anunciaram estudos para a criação de uma novíssima geração desses motores, talvez até para uso em futuros esportivos.  

RX-7, um superesportivo 

Esse Mazda que avaliei em 1992 já era a terceira geração dos RX. A marca japonesa alardeava que, com relação a segunda geração, essa nova era 90 kg mais leve, com design completamente reformulado (e arredondado), e seu novo motor Wankel tinha 55 cv a mais de potência que a do carro anterior. Nem é preciso dizer que menor peso somado a maior potência resultavam em um desempenho assustadoramente melhor: na época, consegui de 0 a 100 km/h na casa dos 6 segundos com o RX-7, e atingi a máxima de 239 km/h na pista do Aeroporto de Viracopos.

O esportivo japonês da Mazda era um foguete, com respostas sempre vivas graças aos dois turbocompressores, sem contar o comportamento dinâmico de fazer inveja a muito superesportivo tradicional mundial. Suas suspensões, por exemplo, eram independentes nas quatro rodas e feitas de duralumínio. O motor dianteiro, compacto e leve, estava ligado a uma transmissão também fundida em alumínio, com tração traseira. E, construtivamente, o carro oferecia uma distribuição de peso perfeita: 50% no eixo dianteiro e 50% no traseiro. Era, de fato, muito equilibrado, tanto nas curvas de alta quanto nas de baixa.  

O carro era uma joia sobre rodas, quer seja para acelerar, frear ou contornar curvas (Foto: divulgação Mazda)

Ainda nas suspensões, buchas especiais de borracha com conteúdo líquido em seu interior garantiam sempre o melhor contato dos pneus com o solo, melhorando a aderência. Direção e freios? Não tinham pontos a serem criticados.  

Não havia o que reclamar do RX-7 no acerto dinâmico ou características técnicas: era um carro muito bem elaborado (Foto: divulgação Mazda)

Na matéria, enalteci a ótima posição de guiar, com bancos de estrutura feita em fibra de vidro e ergonomia perfeita, somando conforto a segurança nas curvas. Me recordo muito bem que a alavanca de mudança de marchas ficava numa posição alta, bem perto do volante, facilitando o manuseio em uma pilotagem esportiva. Uma curiosidade que eu tinha, e que certamente desperta dúvidas na maioria dos adeptos ao assunto: qual ronco ele produzia? O de uma turbina de avião? Apenas o som do turbocompressor? Na verdade, ele tinha barulho similar ao de um motor a pistão, mas, claro, com um pequeno zunido, originário dos triângulos interiores se alternando em seus ciclos.  

O RX-7 é um daqueles modelos que me trazem boas lembranças mesmo passados 32 anos do seu teste. Sem dúvida alguma, uma verdadeira joia sobre rodas, que hoje tem lugar merecido nas coleções e acervos dos apaixonados por carros mundo afora.  

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Jornalista na área automobilística há 50 anos, trabalhou na revista Quatro Rodas por 10 anos e na Revista Motor Show por 24 anos, de onde foi diretor de redação de 2007 até 2016. Formado em comunicação na Faculdade Cásper Líbero, estudou três anos de engenharia mecânica na Faculdade de Engenharia Industrial (FEI) e no Instituto de Ensino de Engenharia Paulista (IEEP). Como piloto, venceu a Mil Milhas Brasileiras em 1983 e os Mil Quilômetros de Brasília em 2004, além de ter participado em competições de várias categorias do automobilismo brasileiro. Tem 69 anos, é casado e tem três filhos homens, de 22, 33 e 36 anos.