Final feliz para o piloto de F1 José Carlos Pace

Moco, como era carinhosamente conhecido no meio automobilístico José Carlos Pace, foi um piloto que iniciou sua carreira nas competições no início dos anos 60, sendo um dos integrantes da famosa Equipe Willys de Competição, comandada pela lenda do automobilismo Luiz Antônio Greco. Depois de fazer muito sucesso em nossas pistas no decorrer da década de 60, Pace já era cotado para a Fórmula 1 em 1972, quando Emerson Fittipaldi ganhou seu primeiro campeonato. Enquanto isso, “Moco” estreava na F1 com um carro March da Equipe Williams.  

Tendo participado praticamente como coadjuvante até 1974, em pequenas equipes, em 75 o então já experiente José Carlos Pace foi guiar um Brabham, e terminou vencendo o GP do Brasil de F1 daquele ano, uma vitória que repercutiu por todo o mundo. Dois anos depois, quando a Brabham trocou seus motores Ford-Cosworth pelos Alfa-Romeo, “Moco” já despontava na imprensa mundial como um dos favoritos ao título de próximo grande campeão. Só que 1977 reservava um destino diferente ao Pace: um acidente aéreo na Serra da Cantareira (SP) vitimou o grande piloto, ainda jovem, de apenas 32 anos. Ele estava indo para a fazenda do amigo Emerson Fittipaldi em Araraquara junto de um outro piloto brasileiro, Marivaldo Fernandes, e todos morreram.  

Moco deixou esposa e um casal de filhos pequenos, tendo como lugar de descanso (quase) eterno o Cemitério do Araçá, na capital paulista. Foi enterrado envolto em uma bandeira brasileira, como merecido para um esportista que representava o país por todo o mundo. Mas nem tudo foi tão em paz e sereno assim: recentemente, o jornalista Ricardo Caruso recebeu informações de que seu túmulo no Araçá tinha sido vandalizado, vilipendiado e todas as placas de identificação furtadas, uma tragédia quase tão grande quanto a do acidente que o vitimou. Dali em diante, “Carusão” (como Ricardo é carinhosamente conhecido pelos amigos) começou um movimento de salvação do local de descanso de Pace.  

Pace e sua então esposa, hoje viúva, Elda D’Andrea (Foto: Photographie/REX Shutterstock)

O primeiro passo foi informar a família, e logo em seguida entrou na história Paulo Roberto Saraiva Figueiredo, conhecido pela maioria como “Paulo Loco”, diretor da área de eventos com carros antigos da CBA (Confederação Brasileira do Automobilismo). Trabalhando juntos, Caruso e Paulo Roberto, tomaram providências para que fossem exumados os restos mortais de “Moco” do túmulo depredado, pertencente à família de sua viúva.  

E não havia melhor lugar para o novo enterro de “Moco” que o Autódromo de Interlagos, que oficialmente se chama…José Carlos Pace, uma tremenda homenagem a um dos automobilistas mais memoráveis da nossa história. Esse movimento para fazer justiça ao descanso eterno do piloto, vencedor até mesmo de um GP de F1 lá em Interlagos, foi trabalhado intensamente, inclusive pela família Pace. Caruso acompanhou a exumação no Araçá e cuidou da parte burocrática do processo (documentações, pedidos, autorizações, traslado, urna e por aí vai), e Paulo “Loco” cuidou das políticas, já que o espaço do Autódromo é da Prefeitura de SP. 

Capacete e macacão de “Moco” também estavam integrando o visual da cerimônia (Foto: Lucca Mendonça)

Atrás do busto de Pace, que já existia próximo da entrada dos boxes, foi criado um espaço para o novo enterro da urna com seus restos mortais. Uma cerimônia para a ocasião ocorreu no dia 23 de agosto de 2024, dando encerramento à um drama que já se arrastava por anos, quando o túmulo do Araçá foi depredado. Finalmente, a partir dali, “Moco” novamente se instalou no local que tanto amava, e que até leva seu nome: o Autódromo José Carlos Pace, em Interlagos.  

Os restos mortais do piloto foram sepultados atrás do seu busto, próximo da entrada dos boxes (Foto: Lucca Mendonça)

A cerimônia do final de agosto reuniu pilotos da velha-guarda e amigos de Pace (Paulo Gomes, Chico Lameirão, Alex Dias Ribeiro, entre outros), além da sua família (a viúva Elda D’Andrea, a filha Patrícia e o filho Rodrigo) e de fãs do piloto, integrantes da CBA, jornalistas e outros. Quase todo o evento teve ao fundo a trilha sonora dos carros da Porsche Cup, que treinavam para a próxima corrida, o que pode até soar como ironia, já que Pace pilotou na segunda metade dos anos 60 um VW Karmann-Ghia equipado com motor Porsche. E, mais: o próprio Karmann com motor Porsche estava lá, em perfeito funcionamento.  

O Karmann-Ghia com motor Porsche, que depois liderou o cortejo antes do enterro (Foto: Lucca Mendonça)

Antes disso, além das palavras de conforto de um religioso, e do discurso de Alex Dias Ribeiro e Rita Fittipaldi (viúva de Wilsinho Fittipaldi), a cerimônia contou com um cortejo especial, onde o Karmann-Ghia, dirigido pelo filho de Pace, que vestia macacão e capacete do pai, foi seguido por uma série de carros dos participantes da ocasião em uma volta completa pela pista de Interlagos. 

Com bastante emoção, inclusive dos pequenos netos de “Moco”, que nasceram bem depois da sua partida, a cerimônia se encerrou com o conforto dos familiares e, certamente, também de Pace. Sua filha Patrícia confidenciou ao Ricardo Caruso que seu pai “com certeza está muito feliz”. E pela primeira e única vez no mundo, um piloto de competição foi enterrado em um autódromo que leva seu nome. Missão cumprida, final feliz! 

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Jornalista na área automobilística há 50 anos, trabalhou na revista Quatro Rodas por 10 anos e na Revista Motor Show por 24 anos, de onde foi diretor de redação de 2007 até 2016. Formado em comunicação na Faculdade Cásper Líbero, estudou três anos de engenharia mecânica na Faculdade de Engenharia Industrial (FEI) e no Instituto de Ensino de Engenharia Paulista (IEEP). Como piloto, venceu a Mil Milhas Brasileiras em 1983 e os Mil Quilômetros de Brasília em 2004, além de ter participado em competições de várias categorias do automobilismo brasileiro. Tem 69 anos, é casado e tem três filhos homens, de 22, 33 e 36 anos.