Chevrolet Grand Blazer: a perua da Silverado em tamanho família

Os anos 90 foram, sem dúvidas, repletos de lançamentos no mercado nacional. De versões nacionais a importadas, o consumidor brasileiro passou a ter muitas opções de veículos novos, algo incomum nos anos de importação e mercado fechados. Na Chevrolet, os lançamentos começaram em 1992 com o Omega, Suprema e Vectra no ano seguinte; Corsa em 1994; S10, Astra e Astra SW em 1995; Blazer, Corsa Pick-up, Corsa Sedan e Vectra B em 1996; Corsa Wagon e Silverado em 1997; fora versões especiais ao longo destes anos. 

A GM Veraneio, uma espécie de “peruona” da D20, saiu de linha em meados de 1994, e o mercado ficou esperando um substituto de peso (e tamanho) para ela. Mas as expectativas foram frustradas quando nada similar foi apresentado de 1995 a 1998. Neste período, a Blazer fazia as vezes do carro de família, a gasolina ou a diesel. Principalmente, com sua versão Executive, movida pelo virtuoso motor V6 4.3 SFI de 180 cv, o Vortec, lançada em 1997. Mesmo assim, com seu porte de SUV médio, próximo ao de um Equinox moderno, ela não era, de fato, a sucessora da enorme Veraneio. 

Isso mudaria em 28 de outubro de 1998, quando foi apresentada ao mercado nacional a Grand Blazer. Na realidade, um Chevrolet Tahoe norte-americano com outro nome. Importada da Argentina, a versão utilitária esportiva da Silverado (legítima substituta da D20) tinha como trunfo seu porte grande. Praticamente imenso. Era moderna, com amplo porta-malas e tampa traseira dividida na horizontal, com vidro e lata separados, possibilitando o acesso sem abrir completamente a tampa e facilitando a operação de acessar o compartimento, que tinha estupendos 1.550 litros! 

Resolvido: no final de outubro de 1998, chegava da Argentina a Grand Blazer (Foto: Chevrolet/divulgação)

Sua versão de lançamento, a DLX, trazia duas opções de motor. Quando gasolina, tinha o antiquado seis cilindros em linha 4.1 MPFI oriundo do Opala, com atualizações, fornecendo 138 cv de potência a 4100 rpm e 30,7 kgfm de torque a 2500 rpm. Com ele, a pesada Grand Blazer acelerava de 0 a 100 km/h em 15s e atingia os 163 km/h de velocidade máxima. E não bebia pouco: 5,8 km/l na cidade e 8,2 km/l na estrada. Seu tanque de 126 litros de capacidade era responsável pela boa autonomia rodoviária, permitindo rodar 1033 km sem reabastecer. Todos são dados oficiais divulgados pela Chevrolet na época do lançamento.

Se fosse a diesel, trazia excelente MWM Sprint 6.07T, um robusto 4.2 turbodiesel de seis cilindros em linha com 3 válvulas por cilindro, que fornecia 168 cv a 3400 rpm e 42,4 kgfm a 2000 rpm. Apesar do maior torque, focava na proposta da robustez, por isso era até mais lenta: 0 a 100 km/h em 18s e 150 km/h de máxima. Compensava nas retomadas de velocidade um tanto mais ágeis, como de 80 a 120 km/h em 16,3s, ante 20,4s da 4.1 a gasolina. Em tempos de diesel mais barato que gasolina, era a opção mais desejada, porém muito mais cara. Sua autonomia em rodovias era de 1272,6 km, consumindo 8,8 km/l na cidade e 11,6 km/l na estrada. Novamente, números da própria marca.

Na realidade, por baixo da enorme carroceria SUV, escondia-se uma base de caminhonete “raiz” (Foto: Chevrolet/divulgação)

Na mecânica básica, era praticamente uma “picapona”, com suspensão dianteira por braços sobrepostos e traseira de eixo rígido com feixe de molas, direção no obsoleto esquema de setor e sem fim, além de freios a disco apenas na frente. A transmissão, sempre manual de cinco marchas, era fornecida pela Eaton na versão a gasolina (caixa FSO-2305B), ou então pela ZF quando equipada com motor turbodiesel (caixa S-542), já que este demandava maior torque e robustez. Ainda assim, não dispunha de tração 4×4: era sempre traseira, com diferencial traseiro de deslizamento limitado, tecnologia batizada de Positraction pela marca na época.  

Suspensão traseira com feixe de molas, direção tipo setor e sem fim, discos traseiros a tambor: pouco moderna, mas bastante bruta (Foto: Chevrolet/divulgação)

Como críticas comuns da imprensa na época, faltavam alguns itens importantes como airbags ou regulagem de altura do banco do motorista, e, por conta do recorte das portas traseiras, suas janelas do banco de trás não desciam mais que 30% da capacidade total. No mínimo, peculiar. Mas, como grande desvantagem, estava o comportamento típico de uma caminhonete tradicional, com muito pula-pula e sacolejo, conforme relatado na avaliação da Revista Quatro Rodas de março de 1999: “a cada imperfeição do piso, lombadas ou valetas, os passageiros traseiros se sentirão como peões no lombo de um cavalo bravo. É muito desconforto”. 

No seu enorme interior, podiam caber cinco ou seis pessoas, mais 1.550 litros de bagagens (Foto: Chevrolet/divulgação)

Ainda assim, a Grand Blazer era luxuosa para os padrões da época, principalmente se comparada com a Veraneio. Trazia como itens de série o que hoje é trivial em qualquer carro pequeno, como direção hidráulica progressiva Servotronic, ar-condicionado, vidros e travas elétricas (portas, tampa de combustível e porta-malas), retrovisores elétricos, além de alarme antifurto, trava de segurança das portas traseiras, direção regulável em altura, desembaçador elétrico do vidro traseiro, espelhos iluminados nos parassóis, iluminação no porta-luvas, porta-malas e compartimento do motor.  

A lista seguia com reostato das luzes do painel, lavador e limpador traseiros, luz de leitura interna central, porta-copos no painel, alças laterais com porta-cabides, relógio digital, alerta sonoro dos faróis ligados, painel completo com conta-giros e voltímetro, tomada 12v, antena elétrica, luzes de cortesia nos forros de porta, bagageiro no teto, estribos laterais, parabrisas com degradê e vidros verdes. Suas rodas eram de alumínio com tala 7” e pneus 245/75 R16, e chamavam a atenção as partes cromadas dos dois parachoques. 

Interior “rústico” vinha da Silverado, e era completo. Mas faltavam coisas importantes, como airbags (Foto: Chevrolet/divulgação)

 

Configurada para seis pessoas, trazia banco dianteiro inteiriço, que, opcionalmente, podia dar lugar a poltronas individuais com um enorme console central entre elas (assim, cabiam cinco). O tecido “Kelly”, similar a um veludo cinza, era mantido, e no mesmo pacote dos bancos individuais também estava incluso um console de teto, que incluía luzes de leitura individuais e outro porta-trecos. Além disso, era possível escolher entre rádio AM/FM estéreo com toca-fitas, ou então um aparelho mais “chique” com toca CD e sistema de som especial. Também era possível adicionar freios ABS nas quatro rodas, já que, de série, o sistema só atuava nas rodas traseiras. 

Para a época, e até para os dias atuais, um carro imenso. Detalhe para a tampa traseira de abertura dupla, com vidro para cima e lata para baixo (Foto: Chevrolet/divulgação)

Parar os 2465 kg da versão a Diesel ou 2335 kg na movida a gasolina era uma tarefa simples, graças a seus freios com discos ventilados na dianteira. Manobrar seus 5,05 m de comprimento também se tornava mais fácil por conta da direção hidráulica não tão pesada. Exigia apenas perícia do condutor, afinal, o veículo tinha 2,00 m de largura e 1,92 m de altura. Para os padrões da época, era muito grande, e conseguia se virar bem no fora-de-estrada, já que tinha a elevada altura do solo e enormes ângulos de ataque e saída. 

Existiam vantagens da base mecânica de caminhonete: além de robusta, a Grand Blazer podia encarar fora-de-estrada e pisos ruins sem reclamar (Foto: Chevrolet/divulgação)

Era carro para impressionar nas ruas, não só por seu tamanho, mas também pelo preço. A versão movida a gasolina custava, em janeiro de 1999, exatos R$56.619,00, ou R$453.003,16 na cotação atual. A turbodiesel já subia para R$68.677,00, ou R$549.478,06 atuais. Quem quisesse chamar mais a atenção, podia ainda escolher dentre duas cores perolizadas (Azul Methyl e Vermelho Nacre), duas metálicas (Prata Mercúrio e Verde Fidji), ou então duas sólidas (Preto Embaixador e Branco Glacial).

Para hoje, uma dessas com motor turbodiesel passaria fácil dos R$550 mil. Esse preço salgado, juntamente com a produção complicada, acabaram atrapalhando seu sucesso (Foto: Chevrolet/divulgação)

Também por ser cara, não almejava tantos compradores, e muitos acabavam escolhendo SUVs importados como Jeep Grand Cherokee ou Mercedes-Benz ML. Além disso, seu processo produtivo também não ajudava: da coluna B para trás, quase tudo vinha importado dos EUA, incluindo portas, tampa traseira, lanternas, vidros e acabamentos internos.  

Como a porção dianteira era similar à da Silverado argentina, podemos dizer que ela era metade sul-americana e metade norte-americana. De acordo com Luciano Santos, ex-diretor de engenharia da divisão de caminhões e ônibus da GM na época (Trucks and Buses Unit), só foi preciso adaptar o alojamento traseiro do seu estepe e mexer no gargalo do tanque de combustível. Aliás, além do Luciano, vale também o nobre agradecimento ao Gerson Borini, ex-engenheiro de desenvolvimento e validação no campo de provas da GM, que nos ajudou na obtenção de informações para elaborar essa matéria.

Entre o final de 1999 e o início de 2000, a picape Silverado se tornou brasileira, passando a sair de São José dos Campos (SP). Porém, a Grand Blazer não a acompanhou: continuou vindo da Argentina em volumes reduzidos. Vale falar que, na ocasião do lançamento, a Chevrolet afirmou que, posteriormente, teria “versões com acabamento simplificado, destinadas a atingir maior gama de compradores, como pequenos, médios e grandes frotistas”. Isso nunca aconteceu de fato, e ela nunca foi além da versão luxuosa DLX. 

Por ser cara de produzir, cara de importar e cara de vender, a Grand Blazer nunca emplacou por aqui. As versões mais baratas prometidas pela Chevrolet também não se tornaram realidade (Foto: Chevrolet/divulgação)

Já no ano 2000, a versão 4.1 a gasolina foi descontinuada, permanecendo apenas a 4.2 turbodiesel. Em meados de 2001, devido aos altos custos de produção e importação, somados a desvalorização do Real, a grandalhona foi retirada de linha no Brasil. Provavelmente, sem atingir os 2 mil exemplares comercializados no total. Hoje, restam pouco menos de 1.400 unidades emplacadas, e achar uma a venda não é uma tarefa tão simples. É do tipo de carro que quem tem, não vende.  

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Leonardo França é formado em gestão de pessoas, tem pós-graduação em comunicação e MKT e vive o jornalismo desde a adolescência. Atua como Consultor Organizacional na FS-França Serviços, e há 21 anos, também como consultor automotivo, ajudando pessoas a comprar carros em ótimo estado e de maneira racional. Tem por missão levar a informação de forma simples e didática. É criador do canal Autos Originais e colaborador em outras mídias de comunicação.