Chevrolet Bel-Air vs. Ford De Luxe na disputa pelo banheiro do posto

Este “causo” é das antigas. Aconteceu lá pelos meados dos anos 50, mais precisamente em 1956, época em que a grande maioria dos leitores sequer tinha nascido. Tudo teve início em Petrópolis, no Rio de Janeiro, onde morava o casal Laerte e Laura, ambos já falecidos. Bem de vida, o casal serrano havia comprado, há pouco mais de um ano, um belíssimo Chevrolet Bel-Air 1954, cupê de duas portas, azul-claro e bege, novinho em folha. Um carro lindo que o casal se orgulhava de desfilar.

Mas como nem tudo na vida é maravilha, em uma quinta-feira à noite, o simpático casal recebeu um telefonema com a notícia que não queria ouvir: a tia Osvaldina, que tanto os ajudara no início da vida, havia falecido na cidade de Santos (SP), onde morava.

O casal precisava ir no velório da falecida, então pegaram o Bel-Air e, de madrugada, partiram para Petrópolis (Foto: Chevrolet/divulgação)

Naquela época, ir de carro de Petrópolis para Santos demorava cerca de 12 horas, isso se o motorista puxasse bem e a estrada ajudasse. Mas o casal decidiu que tinha que estar prestando as últimas homenagens à falecida. Laura preparou alguns lanches com suco para que eles fossem comendo no caminho, evitando paradas desnecessárias, pois o enterro estava marcado para sexta-feira às 17 horas.

Saíram de Petrópolis na sexta mesmo, antes das 4 horas da manhã, e uma hora depois  já estavam rumando para a Via Dutra com destino a São Paulo. Excelente motorista, Laerte fez a puxada viagem em cerca de 11 horas, e eles chegaram no destino às 15 horas para velar a tia Osvaldina. Cansativo, mas valeu pela homenagem póstuma àquela senhorinha.

De Bel-Air na estrada

Cansados, não esperaram sequer o enterro da tia: encerrado o velório, quando o cortejo partiu para o cemitério, o simpático casal partiu de volta na extenuante viagem de retorno para Petrópolis. Mas, claro, esse ritmo alucinante da viagem fez uma vítima: Laerte, se alimentando apenas dos sanduíches e suco preparados por dona Laura, ficou com o intestino desarranjado.

Como estavam no verão, sabiam que teriam luz natural até pouco mais das 19 horas. Haviam combinado que assim que escurecesse, não se arriscariam na Via Dutra: parariam em um hotel na beira da estrada para jantar, tirar uma boa noite de sono e, no dia seguinte, prosseguirem para o Rio. Mas o intestino de Laerte insistia em perturbar. E essa perturbação foi até mesmo prejudicando a condução do Bel-Air. Quen já teve o famoso “piriri” ao volante sabe bem o que ele passou…

Não esperaram o enterro: seguiram viagem novamente para Petrópolis pela Via Dutra, mas parariam para dormir no caminho, mas antes tiveram problemas (Foto: reprodução/clickguarulhos.com.br)

Logo no início da Via Dutra, Laerte percebeu que não ia aguentar: precisava urgentemente de um banheiro, senão o estrago seria grande. No primeiro pequeno posto de combustível que apareceu na rodovia, ainda em São Paulo, Laerte entrou como uma bala. O que ele não esperava era que, ao mesmo tempo, entrou também nesse posto um Ford preto, desses arredondados de duas portas, provavelmente um De Luxe.

Assim como o Bel-Air do Laerte, o tal Ford também entrou rápido. Os dois motoristas pareciam estar em uma competição: entraram velozmente e frearam seco, daquela frenagem de fazer barulho com o pneu.

Corrida pelo vaso

Os dois motoristas desceram ofegantes e Laerte logo perguntou ao frentista: “Rápido! onde é o banheiro?” O funcionário calmamente apontou para uma única porta e disse: “O banheiro é ali e só tem um!”

Ao contrário do Laerte, um cara corpulento e forte, o motorista do misterioso Ford ouviu a resposta do frentista e saiu na frente andando rápido. Parece brincadeira, mas ele padecia do mesmo mal intestinal de Laerte e também buscava desesperadamente por um banheiro.

O que Laerte não esperava era que um Ford também entraria correndo no posto…pelo mesmo motivo (Foto: Ford/divulgação)

Teve início a corrida dos desesperados, e desarranjados. O outro, mais magro e menor, era bem mais ágil. Laerte percebeu que só passo rápido não resolveria seu problema, e logo se pôs a correr.

Quando alcançou o magricela motorista do Ford e, este percebeu a manobra da correria, também se pôs a correr. Mas, graças a sua destreza, o dono do De Luxe chegou primeiro e tudo indicava que ele seria agraciado com o trono da liberdade daquele sofrimento que parecia não ter fim.

Foi aí que Laerte, em uma manobra suja e arriscada, agarrou o magricela do Ford pela gola da camisa e usando sua maior força, jogou o cara para trás: ele foi o rei que sentou no trono e aliviou todas aquelas pressões que o incomodavam há horas. Ufa! Seu problema foi resolvido naquele momento e ele se saiu vitorioso na competição do Chevrolet com o Ford.

Alguns quilômetros adiante, o casal Laerte e Laura achou um hotel digno, onde puderam tomar um bom banho, jantar e descansar uma noite de sono, como tinham planejado.

O magricela motorista do Ford? Laura, que ficou esperando o marido dentro do Bel-Air, contou que ele voltou alguns minutos depois, com cara de vencido e carregando sobre o braço um fardo de jornais que o coitado deve ter usado de forro no banco do Ford para prosseguir sua viagem sabe-se lá para onde. Coisas da vida!

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Jornalista na área automobilística há 48 anos, trabalhou na revista Quatro Rodas por 10 anos e na Revista Motor Show por 24 anos, de onde foi diretor de redação de 2007 até 2016. Formado em comunicação na Faculdade Cásper Líbero, estudou três anos de engenharia mecânica na Faculdade de Engenharia Industrial (FEI) e no Instituto de Ensino de Engenharia Paulista (IEEP). Como piloto, venceu a Mil Milhas Brasileiras em 1983 e os Mil Quilômetros de Brasília em 2004, além de ter participado em competições de várias categorias do automobilismo brasileiro. Tem 67 anos, é casado e tem três filhos homens, de 20, 31 e 34 anos.